A Embaixada dos Estados Unidos no Brasil afirmou nesta quarta-feira (16) que adota como política oficial o reconhecimento de apenas dois sexos, masculino e feminino, considerados “imutáveis desde o nascimento”, conforme previsto na Ordem Executiva 14168, expedida durante o governo do ex-presidente Donald Trump.
A manifestação ocorreu após questionamento sobre a emissão de visto para a deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP), mulher trans, cuja documentação civil brasileira apresenta gênero feminino. Apesar disso, o novo visto expedido pela embaixada a classificou como do sexo masculino. Um visto anterior emitido pela mesma repartição consular trazia a identificação condizente com os registros civis.
Sem comentar especificamente o caso da deputada, a embaixada alegou que os registros de visto são confidenciais por força da lei americana, reiterando que, conforme a norma vigente, “é política dos EUA reconhecer dois sexos, masculino e feminino, considerados imutáveis desde o nascimento”.
Contexto jurídico internacional
A política mencionada pela representação diplomática entra em tensão com normas internacionais de direitos humanos, das quais os EUA são signatários, como o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos (PIDCP). Tais instrumentos vedam discriminação com base em identidade de gênero e impõem aos Estados o dever de respeitar os registros legais de outros países, salvo indícios de fraude ou inconsistência documental.
Além disso, princípios consolidados nas relações diplomáticas e consulares sugerem o respeito à documentação expedida por Estados soberanos, sobretudo quando se trata de autoridades públicas, como é o caso da parlamentar brasileira.
Providências e repercussão
Erika Hilton, que cancelou viagem aos Estados Unidos em razão do episódio, informou que levará o caso à Organização das Nações Unidas (ONU) e à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), alegando violação à sua identidade de gênero reconhecida oficialmente pelo Estado brasileiro. A parlamentar também defende que o Itamaraty convoque o embaixador norte-americano para prestar esclarecimentos.
A Ordem Executiva 14168, editada em 2020, determina que formulários oficiais do governo dos EUA apresentem apenas as opções “masculino” e “feminino” no campo “sexo”, sendo vedado o reconhecimento legal de identidades de gênero distintas das correspondentes ao sexo atribuído no nascimento. A medida enfrenta críticas internas nos Estados Unidos, inclusive de entidades civis, juristas e organizações de defesa dos direitos LGBTQIA+.
O Itamaraty ainda não se pronunciou oficialmente sobre o caso.