Estado de casado com a menor desde os 12 anos não autoriza o ‘distinguishing’ penal no estupro

Estado de casado com a menor desde os 12 anos não autoriza o ‘distinguishing’ penal no estupro

Ter mantido com a menor, desde os seus 12 anos de idade, uma relação de estado de casado e com o consentimento da mãe biológica, não é caso de tratamento penal distinto a afastar a conduta criminosa. Sem possiblidade de que tais circunstâncias esvaziem o crime definido como estupro de vulnerável, não se atende ao pedido de isenção da conduta ilícita, pois o comportamento se amolda a prática expressamente vedada pela legislação. Permaneceu a pena aplicada ao condenado pelo juiz Diego Brum Legaspe Barbosa, de Manicoré. O processo foi reexaminado na Segunda Câmara Criminal do TJAM pelo Desembargador Jomar Ricardo Saunders Fernandes. 

Os autos narram que o fato chegou ao conhecimento do Promotor de Justiça instaurador da ação penal contra o Recorrente, onde o namoro com a garota teria se iniciado sem o consentimento da mãe biológica, às escondidas e por repetidas vezes o acusado manteve relação sexual com a menor, à época com 12 anos de idade. Decorrente dessa situação a menor engravidou e passou a viver com o acusado. Somente assim houve o consentimento materno. 

Durante a tramitação do processo em primeira instância, o acusado usou como estratégia a defesa de que a questão se amoldaria a uma hipótese de ‘distinguishing’ penal. Insistiu, que, ante as nominadas circunstâncias, seria a hipótese de isentá-lo de pena, pois os fatos concretos deveriam ter conduzido a uma decisão que, ante a análise dos detalhes que envolveram o ‘caso’ deveria receber um tratamento penal menos rigoroso. Sem acolher o pedido, o magistrado, na origem o condenou a pena de 20 anos de reclusão, em regime inicial semi-aberto. 

Ausência de dolo, bons antecedentes, endereço certo, emprego fixo, um caso de distinção penal foram argumentos levados ao recurso com vista à modificação da condenação. Sem êxito. A conduta foi típica e se adequou ao comportamento anteriormente previsto na lei que protege o adolescente na esfera penal. Manter relação sexual com menor de 14 anos é presumidamente criminoso, e se cuida de presunção absoluta, sem distinção de tratamento, afastando-se a tese de união estável e constituição de família. Houve dolo.

Se houve o dolo foi intencional. O fato se adaptou ao tipo, ou seja, a fórmula prevista em lei como crime? Entendeu-se que sim.  E arrematou-se que o réu conhecia a idade vulnerável da vítima e com ela praticou relação sexual proibida.

Houve a conjunção carnal ou qualquer outro ato de desejo sexual- libido- não importa eventual consentimento da vítima, pois a menor não tem capacidade de discernir os fatos ou expressar sua vontade e se o faz, essa vontade se revela em ato viciado. Se há vício, não é um ato protegido pelo direito, mormente se a conduta se amolda ao tipo penal do artigo 217-A do Código Penal.  Recurso Negado. 

Processo nº 0000420-42.2016.8.04.5600

Classe/Assunto: Apelação Criminal / Quesitos
Relator(a): Jomar Ricardo Saunders Fernandes
Comarca: Manicoré
Órgão julgador: Segunda Câmara Criminal

Ementa: APELAÇÃO CRIMINAL. PENAL E PROCESSO PENAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO POR ATIPICIDADE DA CONDUTA. IMPROCEDÊNCIA. IRRELEVÂNCIA DO CONSENTIMENTO DA VÍTIMA PARA A PRÁTICA DO ATO, EXPERIÊNCIA SEXUAL ANTERIOR OU EXISTÊNCIA DE RELACIONAMENTO AMOROSO COM O INFRATOR. INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 593/STJ. INAPLICABILIDADE DOS PRINCÍPIOS DA ADEQUAÇÃO SOCIAL E DA INTERVENÇÃO MÍNIMA DO DIREITO PENAL. ERRO DE PROIBIÇÃO NÃO CONFIGURADO. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. À luz da farta jurisprudência consolidada no âmbito do STJ, inclusive com entendimento sumulado (Súmula 593/STJ), o crime de estupro de vulnerável se configura com a conjunção carnal ou prática de ato libidinoso com menor de 14 anos, sendo irrelevante eventual consentimento da vítima para a prática do ato, sua experiência sexual anterior ou existência de relacionamento amoroso com o agente. 2. Desse modo, a convivência marital entre o autor e a vítima de apenas 12 (doze) anos de idade, bem como a aprovação da genitora da menor, não representam peculiaridades capazes de afastar, no caso concreto, a aplicação do precedente vinculante oriundo da Corte Superior. 3. Em relação aos princípios da adequação social, segundo o qual não pode ser considerado criminoso o comportamento humano que, embora tipificado em lei, não viola o sentimento social de justiça, revela-se inaplicável à espécie. Isto porque o bem jurídico tutelado pelo legislador nos crimes de estupro de vulnerável é o saudável crescimento físico, psíquico e emocional de crianças e adolescentes menores de 14 (quatorze) anos, portanto a conduta apurada não deve ser relativizada, em consonância com o entendimento pacífico do STJ. Por igual motivo, inviável a aplicação do princípio da intervenção mínima do direito penal. 4. Ademais, merece ser rechaçada a arguição de erro de proibição como excludente da culpabilidade, pois as condições pessoais do recorrente não constituíram óbice para que o mesmo detivesse a consciência da ilicitude de seu comportamento, tal como demonstrado em juízo. 5. Recurso conhecido e não provido.

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