Brasília – A Defensoria Pública da União (DPU) encaminhou recomendação às secretarias de saúde do estado e dos municípios do Acre pedindo a inclusão dos refugiados indígenas venezuelanos Warao entre os grupos prioritários para vacinação contra a covid-19.
A DPU pede a inclusão da etnia em igualdade de condições com os indígenas brasileiros, para que possam ser vacinados, conforme cronograma previsto nos planos de vacinação dos municípios e do estado do Acre. O principal argumento é que os grupos se encontram em situação de maior vulnerabilidade em relação à transmissão do vírus e ao desenvolvimento de complicações graves da covid-19.
A recomendação também contempla as seguintes responsabilidades, imputadas às secretarias de saúde do estado e dos municípios do Acre: “combater a desinformação que desestimula refugiados indígenas venezuelanos Warao a se vacinarem”; iniciar, no prazo de cinco dias do recebimento da recomendação, “a vacinação da população de refugiados indígenas venezuelanos Warao, independentemente dos Distritos Sanitários Especiais Indígena (Dsei) e independentemente de, na presente data, estar em curso a vacinação da população geral não prioritária”; e “realizar uma busca ativa em parceria com as secretarias estadual e municipais de assistência social para vacinar toda a população indígena venezuelana Warao que vive nos municípios acreanos”.
O defensor responsável, Matheus Alves do Nascimento, argumenta que o critério adotado no “Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação Contra a Covid-19” demonstrou “racismo institucional”, por ter definido como indígenas apenas os povos que vivem em aldeias de terras indígenas homologadas, “ignorando a complexidade do processo de demarcação, indígenas que vivem em contexto urbano e os povos venezuelanos que se encontram refugiados no Brasil”. Em razão disso, o plano apenas considerou como pertencente ao grupo prioritário os indígenas das aldeias inseridas em terras demarcadas, “e determinou que a vacinação será realizada em conformidade com a organização dos Distritos Sanitários Especiais Indígena (Dsei) nos diferentes municípios”.
Para sustentar tais questionamentos ao critério constante do plano nacional de vacinação, a recomendação destaca os tratados e convenções internacionais ratificados (aceitos como obrigatórios) pelo Brasil, que não permitem a diferenciação e exclusão de indígenas que não vivam em terras demarcadas, e tampouco daqueles refugiados e oriundos da etnia venezuelana.
Ademais, sustenta que o Estatuto do Índio, aprovado pela Lei Federal nº 6.001, de 19 de dezembro de 1973, define como indígena “o indivíduo de origem e ascendência pré-colombiana que se identifica e é identificado como pertencente a um grupo étnico cujas características culturais o distinguem da sociedade nacional”. A norma inclusive orienta o posicionamento institucional da Fundação Nacional do Índio (Funai), segundo a qual “não cabe ao Estado reconhecer quem é ou não indígena, mas garantir que sejam respeitados os processos individuais e sociais de construção e formação de identidades étnicas, uma vez que identidade e pertencimento étnico não são conceitos estáticos, mas processos dinâmicos de construção individual e social”.
Dessa forma, nas palavras do defensor signatário da recomendação, “a população indígena Warao que hoje habita o Acre é composta por refugiados e solicitantes de refúgio em situação de extrema vulnerabilidade social, que foram obrigados a deixar suas terras de origem devido à grave crise humanitária na Venezuela, e que não os enquadrar no grupo prioritário para a vacinação contra a COVID-19 se configura, portanto, como grave discriminação por sua condição de refúgio, vedada pelo art. 3º da Convenção das Nações Unidas relativa ao Estatuto dos Refugiados de 1951”.
A recomendação também esclarece que “os refugiados indígenas venezuelanos Warao estão, por questões sociais e culturais, mais propensos à contaminação pelo novo coronavírus e ao desenvolvimento da doença em sua forma mais grave”, e constata que a etnia já está sendo vacinada em outros estados brasileiros que corretamente enquadraram tais indígenas nos grupos prioritários de vacinação contra a Covid-19.
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Fonte: DPU/DEF