A 26ª Vara Federal de Porto Alegre (RS) garantiu a concessão do benefício de aposentadoria por incapacidade permanente a uma trabalhadora doméstica de 66 anos. Na sentença a juíza Catarina Volkart Pinto utilizou-se das orientações e protocolo para julgamento com perspectiva de gênero.
A autora ingressou com ação contra o Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) afirmando possuir problemas de saúde que a impedem de retornar ao trabalho de diarista. Argumentou ter ingressado com solicitação junto ao INSS para o recebimento do benefício em setembro de 2023, mas que teve o pedido negado.
Em sua defesa, o INSS destacou que a mulher está inscrita no Regime Geral de Previdência Social (RGPS), desde setembro de 2016, como segurada facultativa, portanto, presumidamente sem atividade de caráter profissional. Assim, nesta condição, não pode ser avaliada pela perícia judicial como se exercesse atividade laboral remunerada.
Ao analisar o caso, a juíza observou que os benefícios de incapacidade temporária e de aposentadoria por incapacidade permanente são benefícios previdenciários ligados à perda da capacidade laboral do segurado, sendo necessário, para a sua concessão, comprovação da condição de incapaz. A magistrada também pontuou que a incapacidade temporária se dá quando o segurado ou a segurada estiver incapacitado(a) de exercer a sua atividade por 15 dias ou mais. Já a aposentadoria por incapacidade permanente é concedida ao trabalhador que não tiver condições de readquirir a saúde para o exercício de trabalho que garanta o seu sustento.
A partir de perícia médica judicial, Volkart Pinto pôde constatar que a autora sofre com síndrome do túnel do carpo, condição causada pela compressão dos nervos da mão e que afeta a mobilidade do membro. A perícia apontou que o início provável da incapacidade se deu em setembro de 2023, tendo previsão de recuperação até novembro de 2024, e que a melhora não depende de cirurgia.
A juíza pontuou que a autora teve seu último vínculo empregatício em 2015 na função de empregada doméstica e que ela falou para o perito que trabalhou como diarista até agosto de 2023. “Alega que fez o recolhimento na categoria equivocada (segurada facultativa), quando deveria ter recolhido como contribuinte individual. Ainda que assim não fosse, cabe aqui, ainda, referir que, se a legislação permite ao segurado facultativo a concessão de benefício por incapacidade, aquela pessoa que exerce atividades domésticas também pode ser beneficiária. Embora não possua um vínculo de emprego formal, também trabalha e, portanto, são as atividades domésticas que devem ser analisadas para fins de eventual incapacidade”.
A juíza ainda discorreu a respeito da alegação levantada pelo INSS de que a ausência de incapacidade da autora parte da premissa de que a atividade dela seria decorrente de seu enquadramento como contribuinte facultativa (“do lar”). Para a magistrada, o caso é atravessado por questões de gêneros, que implicam na desvalorização do trabalho doméstico, considerado menos relevante e menos desgastante que as atividades esterotipadamente vinculadas aos homens e que ocorrem no âmbito público.
“Todavia, uma vez afastados os estereótipos de gênero, constata-se que as atividades domésticas não são improdutivas e demandam, sim, esforço físico, embora nem sempre sejam remuneradas (tanto é que ensejam a possibilidade de vinculação como segurado facultativo quando não remuneradas). E é a partir dessa compreensão que os casos concretos devem ser analisados“, concluiu.
Levando em consideração que a mulher já tem histórico de problemas de saúde que lhe permitiram o recebimento de benefício por incapacidade temporária entre 2022 e 2023, e que a idosa possui baixa instrução, Volkart Pinto percebeu que as circunstâncias dificultam a reinserção da mulher ao mercado de trabalho. Dessa forma, a juíza julgou parcialmente procedente a ação condenando o INSS à concessão da aposentadoria por incapacidade permanente à idosa, com data inicial estipulada em setembro de 2023. Cabe recurso às Turmas Recursais.
Com informações TRF4