Desembargadora cassa decisão que citava silêncio do réu como indício para ser julgado em Júri

Desembargadora cassa decisão que citava silêncio do réu como indício para ser julgado em Júri

A Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM) anulou uma sentença proferida pelo Juízo do Tribunal do Júri que submetia um réu a julgamento popular por homicídio. A decisão, de relatoria da Desembargadora Vânia Maria Marques Marinho, foi fundamentada na identificação de um juízo de valor inapropriado no processo, violando o direito constitucional ao silêncio.

O caso em questão trata da morte de Alexandra Lima Monteiro, de 53 anos, encontrada sem vida em junho de 2023, no bairro Cidade de Deus, Zona Norte de Manaus. A vítima apresentava sinais de agressão e o rosto desfigurado, o que levou à abertura de um inquérito policial e, posteriormente, à pronúncia de um suspeito para julgamento pelo Tribunal do Júri.

Na decisão de pronúncia – que submete o réu ao Júri Popular –, o juiz mencionou que “a instrução da fase sumariante demonstrou, pelo próprio interrogatório que o réu Moysés Marques Vieira compareceu e exerceu seu direito constitucional ao silêncio”, acrescentando que “os demais elementos de prova carreados aos autos levam a indícios de participação na morte da vítima”. Essa observação motivou a impetração de habeas corpus por parte da Defensora Pública Ellen Cristine Alves de Melo, que apontou a ilegalidade da consideração do silêncio do réu como indício de culpa.

A Defensora argumentou que o direito ao silêncio é uma prerrogativa constitucional que não pode ser interpretada de forma negativa ou usada como prova de participação no crime. O artigo 186 do Código de Processo Penal (CPP) garante que o acusado seja informado sobre o direito de permanecer calado, e a valoração negativa desse direito pode comprometer a imparcialidade do Conselho de Sentença, composto por jurados leigos.

Ao analisar o habeas corpus, a Desembargadora Vânia Maria Marques Marinho reconheceu a irregularidade na decisão do juiz de primeira instância. Embora tenha destacado que o habeas corpus não é o meio adequado para questionar esse tipo de irregularidade, a magistrada entendeu que o caso configurava uma flagrante ilegalidade, justificando a intervenção.

“Percebe-se flagrante ilegalidade em virtude de a autoridade coatora versar, em sua decisão, acerca da deliberação do Paciente de permanecer em silêncio, à medida que sugere verossimilhança aos fatos apresentados pela acusação”, afirmou a Desembargadora em sua decisão.

Como resultado, a sentença de pronúncia foi anulada, e os autos foram remetidos para que uma nova decisão seja proferida, sem a inclusão do juízo de valor sobre o exercício do direito ao silêncio, a fim de que esse contexto não influencie os jurados durante a sessão do Júri. O voto da Relatora foi seguido à unanimidade na Primeira Câmara Criminal do Amazonas. 

007619-85.2024.8.04.0000        
Classe/Assunto: Habeas Corpus Criminal / Homicídio Qualificado
Relator(a): Vânia Maria Marques Marinho
Comarca: Manaus
Órgão julgador: Primeira Câmara Criminal
Data do julgamento: 17/08/2024
Data de publicação: 17/08/2024
Ementa: PENAL E PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. SENTENÇA DE PRONÚNCIA. IMPOSSIBILIDADE DE SUCEDÂNEO RECURSAL. SILÊNCIO EM DESFAVOR DO RÉU. DIREITO DE PERMANECER EM SILÊNCIO. AMPLA DEFESA ASSEGURADA AO RÉU. NÃO CONHECIMENTO DO HABEAS CORPUS E CONCESSÃO DA ORDEM DE OFÍCIO

 

 


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