A denúncia por crime descrito em norma penal em branco deve conter a regra que a complementa de modo explícito e completo, sob pena de ser inepta por inviabilizar a formação do juízo de tipicidade e prejudicar a defesa.
Com essa fundamentação, a juíza relatora Ana Maria Marco Antônio, da Turma Recursal do Grupo Jurisdicional de Araguari (MG), negou provimento a recurso de apelação do Ministério Público e manteve a sentença que decretou a inépcia da denúncia contra um homem acusado de cometer infração de medida sanitária preventiva, prevista no artigo 268 do Código Penal.
“A menção genérica ao comitê extraordinário da Covid-19 não satisfaz a complementação que carece o tipo penal em branco do artigo 268 do CP. A devida complementação com descrição do que foi transgredido somente fora mencionada nos autos com as razões recursais”, assinalou a julgadora.
A relatora considerou “extemporânea” a especificação da regra a ser integrada ao tipo do artigo 268 do CP apenas na fase recursal, porque isso deveria ocorrer no momento da oferta da inicial acusatória ou, no máximo, antes do prazo de resposta do réu. “Considero insuficiente a denúncia, diante da rasa menção à norma transgredida”, concluiu.
A promotora Cristina Fagundes Siqueira sustentou em sua apelação que a Deliberação do Comitê Extraordinário da Covid-19 nº 130, do Governo de Minas Gerais, “criou sim as restrições de circulação com alcance para todos os municípios classificados na Onda Roxa, os quais, se quisessem, poderiam estabelecer ou não normas complementares mais restritivas”.
A representante do MP reproduziu no recurso artigos da deliberação, entre os quais o que proibia, na época mais crítica da pandemia, a “circulação de pessoas sem o uso de máscara de proteção, em qualquer espaço público ou de uso coletivo, ainda que privado”. Por fim, a promotora requereu a reforma da decisão que rejeitou a denúncia e a juntada aos autos de cópia da Deliberação do Comitê Extraordinário da Covid nº 130.
Na sentença que rejeitou a denúncia, o juiz Haroldo Pimenta, da 3ª Vara do Juizado Especial Cível e Criminal de Araguari, observou que o reconhecimento da inépcia é possível a qualquer tempo ou grau de jurisdição, mesmo após o recebimento da inicial, por se tratar de matéria de ordem pública.
Pimenta destacou que “a denúncia padece de grave vício, que tolhe a apreciação do mérito da causa penal, porque limita-se a mencionar que o réu infringiu determinação do poder público destinada a impedir a propagação de doença contagiosa”.
Desse modo, o julgador entendeu que o crime do artigo 268 do CP atribuído ao réu (infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa), por ser norma penal em branco, ficou sem a necessária complementação.
O acusado foi abordado por policiais militares caminhando em uma rua, na noite de 30 de março de 2021. O MP o denunciou pelo crime previsto no artigo 268 do CP, porque ele não usava máscara de proteção facial e circulava em via pública fora do horário permitido, em desacordo com deliberação do Governo estadual. Com informações do Conjur
Apelação criminal 0012726-29.2021.8.13.0035