O STJ entendeu que uma pessoa que foi alvo de delação em acordo de colaboração premiada pode acessar as gravações das tratativas desse acordo e da audiência judicial que o homologou, para verificar se o acordo foi espontâneo e celebrado de acordo com a lei. Segundo o tribunal, o acordo de colaboração premiada funciona como um meio de obtenção de prova, e quem se considera prejudicado tem o direito de verificar a validade da medida que fez com que esse tipo de prova chegasse ao processo.
Segundo o relator do recurso no STJ, ministro Rogerio Schietti Cruz, o artigo 3º-A da Lei 12.850/2013 estabelece que o acordo de colaboração premiada tem natureza híbrida, sendo ao mesmo tempo um negócio jurídico processual e um meio de obtenção de prova.
Apesar dessa natureza jurídica mista, o ministro explicou que o primeiro aspecto prevalecia na jurisprudência quando se discutia a legitimidade do terceiro delatado para impugnar a validade do acordo: uma vez que se tratava de negócio jurídico personalíssimo, cabia ao terceiro apenas confrontar o conteúdo da palavra e das provas apresentadas pelo delator, mas não a validade formal do acordo celebrado.
O relator explicou que esse cenário começou a mudar em recentes julgados da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), que passou a entender que, como meio de obtenção de prova, o acordo pode impactar gravemente a esfera jurídica do terceiro delatado, razão pela qual é necessária a observância da legalidade, cujo desrespeito pode ser questionado por quem foi prejudicado.
Ao fazer um paralelo com a colheita de provas contra terceiros na busca e apreensão, o ministro comentou que é natural que esses terceiros tenham interesse e legitimidade para impugnar não apenas o conteúdo de tais provas, mas também a validade da medida que fez com que elas chegassem aos autos.
“Não é apenas o conteúdo da prova colhida que interfere na esfera jurídica do acusado, visto que esse conteúdo só pode ser valorado se a forma pela qual foi obtido for lícita. Daí a impropriedade de se sustentar que são apenas as provas fornecidas pelo delator que atingem o delatado, e não o acordo em si, porquanto foi só por meio do acordo – o qual deve respeitar a lei – que as provas foram obtidas”, disse.