Com o objetivo de realizar um levantamento sobre as condições dos flutuantes do Tarumã-Açu, o Grupo de Trabalho (GT) criado pela Defensoria Pública do Estado do Amazonas (DPE-AM), esteve na sexta-feira (3), nas comunidades da região para uma visita técnica. A atividade foi acompanhada por profissionais do Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam).
“Tomamos a decisão em conjunto da necessidade de levantamento por todas as especializadas a respeito das peculiaridades da região. Antes dessa nossa visita, houve, por exemplo, a visita do colega defensor do Núcleo do Consumidor, que observou as questões relativas à relação de consumo. Temos no grupo defensores observando tanto as questões referentes à moradia e também do meio ambiente. Isto se fez necessário pois apontamos dentro do processo que há uma série de interesses que envolve a existência dos flutuantes”, explica o defensor público e coordenador do GT, Carlos Almeida.
“Há diversas famílias que vivem aqui na localidade e precisam de toda essa estrutura e infraestrutura. Há moradores aqui que fazem o transporte para que crianças possam estudar, para que pessoas possam ser atendidas em postos de saúde. Então é obrigação nossa fazer relatório específico sobre a situação. A Defensoria está fazendo o seu papel institucional, mostrando que a situação é muito mais diversa e que muitos dos moradores que aqui se encontram são moradores tradicionais”, complementa Carlos.
Meio ambiente
Acompanhando a visita, o geólogo da gerência de recursos hídricos do Ipaam, Enéas Bonora, ressalta que o órgão visa evitar a degradação do meio ambiente, em especial os recursos hídricos.
“É de suma importância essa nossa vinda até aqui, porque a ideia principal, até então, é fazer o levantamento da condição atual dessas ocupações aqui no Tarumã e quais estão em condições de realmente pleitearem as suas devidas licenças. E o papel do Ipaam, nesse caso, mais especificamente da gerência de recursos hídricos, é garantir que os requisitos mínimos sejam atendidos para obtenção de tal licença”, comenta.
Parceira
No último dia 24 de abril, a DPE-AM articulou com o Ipaam uma cooperação técnica que deve acelerar o processo de licenciamento dos flutuantes do Tarumã-Açu que funcionam apenas como moradias.
A parceria foi alinhada pela defensora pública Elânia Nascimento, integrante do GT, e com gerente de Recursos Hídricos do Ipaam, Daniel Nava, após uma reunião em que o órgão ambiental fez esclarecimentos a respeito da retomada do processo de licenciamento de flutuantes, que estava suspenso por força de uma resolução de 2022 do Conselho Estadual de Recursos Hídricos (CERH), derrubada por decisão do Tribunal de Contas do Estado do Amazonas (TCE-AM).
Comunidade unida
Vice-presidente da comunidade Nossa Senhora de Fátima, dona Eliane Lima, destaca a importância daqueles que habitam os flutuantes próximo à região. Segundo Eliane, a presença dos vizinhos é fundamental para a vida ativa na comunidade. Ela teme que uma possível retirada prejudique diretamente os moradores do local.
“Os moradores dos flutuantes são de suma importância para a nossa comunidade, porque eles utilizam a escola, os moradores vêm até o posto médico em busca de atendimento e também consomem dos comércios locais. É um meio de sobrevivência, tanto para nós, que somos moradores, como para eles que vêm aqui comprar as coisas da comunidade. Aqui ninguém tem nada contra os flutuantes. A nossa preocupação é se torne uma comunidade abandonada, pois nós temos os visitantes nos finais de semana, que trazem benefícios para a comunidade. Está faltando sensibilidade de olhar essas questões”, diz a líder comunitária.
Ação social
De acordo com a presidente da Associação de Moradores da Marina do Davi, Sara Guedes, existe a preocupação com relação ao desenvolvimento da cidadania e consciência ambiental passada desde muito cedo às crianças que residem no local.
“As pessoas pensam que aqui somos um amontoado de flutuantes, que somos uma bagunça, mas não é assim, nós cuidamos, dentro das nossas limitações, da parte ambiental. Existe também toda uma questão de ação social que a gente tenta manter e pouca gente sabe. Há toda uma vida aqui que precisa ser olhada e respeitada. Temos o trabalho do Pablo Casado, campeão brasileiro e presidente da Federação Amazonense de stand-up paddle feito com crianças indígenas aqui da comunidade, que é relevante e traz esse conceito de preservação e respeito”, diz Sara.
O atleta Pablo Casado, que lidera o projeto voltado às crianças desde 2016, explicou sobre atividade desenvolvida com os pequenos das etnias Karapana e Satere Mawé.
“Não temos políticas públicas para o Lago do Tarumã, e o ato de remar está diretamente ligado com as pessoas que vivem na beira do rio. Temos um trabalho social que começou com as crianças que remam aqui com a gente e fazemos esse trabalho já visando desenvolver o cidadão, um atleta. Trabalhamos a consciência ambiental e passamos para essas crianças o conceito de preservar o Lago do Tarumã e quem sabe, ensinando uma profissão também. Nós temos hoje em dia atletas que saíram aqui do Lago do Tarumã que são campeões mundiais em outras modalidades e o nosso grande objetivo é formá-los, e tudo isso deve ser levado em consideração antes de mexerem com as pessoas daqui.”
Retirada e suspensão
A ordem de retirada dos flutuantes foi suspensa liminarmente no dia 20 de março pelo juiz do caso, Glen Hudson Paulain Machado, da Vara Especializada do Meio Ambiente da Comarca de Manaus, a pedido da DPE-AM, que apontou nulidades no processo, cujo cumprimento da sentença estava marcado para acontecer ainda em março.
O processo que culminou na ordem de retirada é uma Ação Civil Pública (ACP) ajuizada em 2001 pelo Ministério Público do Estado do Amazonas (MPAM) contra, à época, o Município de Manaus e 74 proprietários de flutuantes situados às margens dos rios da capital.
A ação fundamentava-se em preocupação com o estágio de degradação dos mananciais que circundam o município, e com os prejuízos ambientais atribuídos à proliferação dos flutuantes na região.
A Defensoria foi procurada por pessoas que moram e trabalham em flutuantes e que não foram ouvidas no processo. A instituição entrou na causa como Custos Vulnerabilis.
Com informações DPE/AMAZONAS