A 12ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), de forma unânime, deu parcial provimento às apelações da União e da Fundação Nacional do Índio (Funai) contra a sentença, proferida pela 1ª Vara da Seção Judiciária do Acre, que julgou procedente o pedido para condenar ambas as apelantes a adotarem as medidas necessárias à conclusão do processo de demarcação da terra indígena Guanabara, localizada nos municípios de Assis Brasil e de Sena Madureira, no estado do Acre, no prazo máximo de 24 meses.
A Funai alegou que houve violação ao princípio da separação dos Poderes, argumentando que o Judiciário não deve interferir nas decisões administrativas do órgão, como a escolha de prioridades na política indigenista. Também mencionou a “reserva do possível”, afirmando que a Funai tem muitas demandas e recursos limitados, o que torna inviável cumprir o prazo imposto para a demarcação da terra indígena Guanabara. Já a União argumentou que não deveria ser parte do processo e sustentou que a separação dos Poderes foi violada, não cabendo ao Judiciário interferir na demarcação de terras indígenas.
Consta nos autos que, conforme a Constituição, terras tradicionalmente ocupadas por indígenas são bens da União. Segundo a relatora do caso, desembargadora federal Rosana Noya Alves Weibel Kaufmann, o processo de demarcação da terra indígena Guanabara foi iniciado pela Funai em 2003, mas não foi concluído até agora, mais de 20 anos depois. “Tendo em vista o lapso temporal, impende reconhecer a mora estatal no cumprimento das disposições constitucionais e legais, inclusive pela proteção insuficiente aos povos indígenas ameaçados por conflitos na região”, disse a relatora.
A magistrada destacou que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já admitiu a intervenção do Poder Judiciário para implementar políticas públicas quando há atraso ou omissão administrativa, especialmente no processo de demarcação de terras indígenas. A jurisprudência do STJ reconhece que a demarcação de terras indígenas é um procedimento complexo, exigindo tempo e recursos significativos. No entanto, essa complexidade não justifica a demora excessiva, que pode restringir os direitos indígenas. Para a relatora, o argumento de falta de recursos (“reserva do possível”) não é suficiente para justificar a inércia do governo, pois compromete a eficácia das normas constitucionais.
O Colegiado decidiu que o Poder Judiciário pode impor um prazo máximo para concluir processos de demarcação de terras indígenas para evitar atrasos excessivos e garantir que os direitos constitucionais dessa população sejam respeitados. Quanto à multa por descumprimento da sentença, embora inicialmente fixada em R$ 100.000,00 por mês de atraso, o valor foi considerado excessivo. Por isso, a multa foi reduzida para R$ 50,00 por dia de atraso.
Processo: 0006441-62.2014.4.01.3000