O Superior Tribunal Militar (STM) decidiu declarar um coronel da reserva do Exército indigno do oficialato e decretou a perda de seu posto e de sua patente. Antes, o militar já tinha sido condenado no STM por corrupção passiva, a mais de seis anos de prisão, por receber propina para facilitar a importação de um fuzil.
O julgamento da ação declaratória de indignidade para o oficialato é um julgamento ético, proposto pelo procurador-geral da Justiça Militar quando o oficial é condenado a crimes com penas superiores a dois anos de reclusão, com trânsito em julgado, ou seja, não se pode mais recorrer da decisão. O instituto é previsto na Constituição Federal.
O caso foi julgado no último dia 1º de fevereiro. O coronel tinha sido sentenciado à pena de 6 anos e 8 meses de reclusão, com regime inicial semiaberto, em razão da prática do delito de corrupção passiva, previsto no art. 308 do Código Penal Militar.
De acordo com a denúncia, o militar era o chefe da seção de controle de aquisições da Diretoria de Fiscalização de Produtos Controlados (DFPC), em Brasília, e assinou o Certificado Internacional de Importação (CII).
Para isso, recebeu propina no valor de R$ 40 mil, dividida em duas parcelas, de um civil com registro CAC (Colecionador, Atirador e Caçador), para que autorizasse a importação de um Fuzil Barrett, modelo 82-A1, semi-automático, calibre 50, com cano de 29 polegadas, de uso restrito das Forças Armadas.
Este tipo de armamento tem sua aquisição proibida para CACs. Ainda conforme a representação, o réu civil não tinha o tempo suficiente como colecionador para adquirir arma de tamanha potencialidade e havia restrições quanto ao calibre, ao cano e ao fato de ser semiautomática.
“Impende esclarecer que o agente militar possuía vasta experiência e chefiava a Seção de Controle de Aquisições de Produtos Controlados, setor responsável por aferir pedidos de armamentos e munições. Alegar desconhecê-los não é plausível.
Acrescente-se a impropriedade da justificativa de a concessão de certificado ilegal ser decorrente do acúmulo de serviço e do desconhecimento de normas. Pelo contrário, tratando-se de requerimento de armamento de alta potencialidade, que fugia das atividades rotineiras da DFPC, cumpria ao acusado, ainda que com acúmulo de trabalho, o dever de cautela”, informou o Ministério Público Militar.
A defesa do coronel, por sua vez, informou que apenas o fato de ter sido sentenciado não era suficiente para que a ação fosse provida. “São muitos e muitos os casos em que esta egrégia Corte não atendeu ao pedido da PGJM”.
O advogado sustentou também que a condenação aplicada ocorreu em decorrência de um fato isolado, situação que em nada maculou os preceitos éticos que norteiam a relação entre o militar e a Força à qual está vinculado, tendo em vista tratar-se de um homem probo.
“O ocorrido foi um ‘fato isolado na vida do representado que teve, durante todos os anos que esteve na Força, comportamento correto e grande dedicação com as funções que lhe foram atribuídas, pelo que deve ser julgada improcedente esta Representação para Declaração de Indignidade para o Oficialato e, assim, mantido o status que atualmente ostenta’, disse a defesa.
Mas a relatora do caso no STM, ministra Maria Elizabeth Rocha, não aceitou os argumentos da defesa do oficial.
“A despeito do empenho defensivo, não foi suficiente para o desprovimento da ação”. A magistrada afirmou que o crime de corrupção passiva visa resguardar a Administração Militar, na medida em que exige de seus agentes a probidade no desempenho das funções.
“Exige-se do servidor, e particularmente do militar, o cumprimento do seu dever legal, sendo certo que um desvio de função de tamanha gravidade deve ser punido. O réu militar infringiu seu dever funcional, mercadejando com a função pública. Restou, por certo, violada a ordem administrativa castrense”.
A ministra relembrou que, como pontuado pela PGJM, o esquema de corrupção e a condenação do coronel, por este Superior Tribunal Militar, foram objeto de matérias jornalísticas, tamanha a gravidade da prática criminosa perpetrada.
“Convém destacar, ademais, ser o representado, à época dos fatos, conhecedor das legislações pertinentes às atribuições legais que exercia, bem como possuir vasta experiência, pois chefiava a Seção de Controle de Aquisições de Produtos Controlados, setor responsável pela aferição de pedidos de armamentos e munições.
Nesse cenário eleva-se, ainda mais, o grau de responsabilidade daquele que, mediante o recebimento de vantagem indevida, pratica, omite ou retarda ato de ofício de sua esfera de atribuições em favor de interesses escusos”.
Para a relatora, a conduta praticada pelo Coronel do Exército configura clara violação do dever de fidelidade para com a Instituição Militar a que servia, ferindo frontalmente a honra, o decoro e o pundonor militares. “Certo é que a extensa experiência do representado, no que concerne à vida na caserna, não deveria arrefecer seus freios inibitórios.
Ao revés, dele esperava-se, devido aos longos anos de serviço, o enrijecimento da postura ética e do bom exemplo. Dúvidas inexistem acerca da repercussão antiética da conduta do oficial sub judice. O seu agir, além de violar bens jurídicos penalmente tutelados, conspurcou a honra militar e o decoro da classe, maculando a imagem do Exército Brasileiro”.
Em razão disso, a relatora votou no sentido de conhecer e julgar procedente a Representação.
REPRESENTAÇÃO P/ DECLARAÇÃO DE INDIGNIDADE/INCOMPATIBILIDADE Nº 7000472-20.2022.7.00.0000/DF
Com informações do STM