“O não exercício de certo direito, por parte do seu titular, em considerável lapso temporal, gera a crença real e efetiva de que esse direito não mais será perseguido”. Com essa postura jurídica, o Desembargador Airton Luís Corrêa Gentil, do TJAM, liderou julgamento de recurso contra sentença que negou pedido de reajuste de aluguel entabulado entre um particular e a Prefeitura Municipal de Manaus.
É comum que o credor opte por não exigir determinada obrigação não cumprida no tempo, tolerando a dívida total ou parcial da outra parte com o intuito de preservar a relação contratual.
No entanto, essa postura pode mudar, e o credor pode decidir exigir o adimplemento integral das obrigações. A mudança de comportamento pode gerar desequilíbrios, especialmente se o devedor formar uma expectativa de que tais obrigações não lhe seriam mais exigidas. Além disso, a deliberação repentina do cumprimento de obrigações não cobradas anteriormente pode resultar em medida desproporcional ao devedor.
A questão central se referiu a um contrato de aluguel firmado entre um particular e o Poder Público Municipal. O locador afirmou que pelo transcurso de um ano o valor do aluguel mensal, embora pago não foi honrado com os reajustes contratados, o que teria causado prejuízos em torno de R$ 100 mil. A decisão de origem concluiu que esse reajuste não contou com previsão automática no contrato.
Para tanto, o magistrado invocou o artigo 56 da Lei 8245/91 onde se prevê que a permanência do locatário no imóvel por mais de 30 dias, sem qualquer oposição do locador, o contrato de locação terá sido prolongado nas condições ajustadas anteriormente. O autor, no entanto, alegou que não houve renúncia expressa que permitisse a conclusão do juízo sentenciante.
A decisão em segundo considerou que houve uma prolongada omissão do autor, autorizando o entendimento de que o direito à cobrança sofria limitações em face da boa fé objetiva.
Quando o direito não é exercido nessas circunstâncias considera-se que houve desinteresse ou abandono, e exercê-lo posteriormente violaria o princípio da segurança jurídica e a boa-fé, fundamentais nas relações contratuais. É o instituto da supressio. A inércia prolongada de uma parte efetivamente pode gerar para a outra a expectativa de que determinado direito não será mais exercido.
Diferentemente da prescrição e da decadência, não existe um prazo determinado para que reste configurada a supressio. O instituto decorre de cláusulas gerais, ficando sujeito a interpretação com maior grau de liberdade por parte do julgador.
“O princípio da boa-fé impõe um padrão de conduta a ambos os contratantes no sentido de recíproca cooperação, com consideração dos interesses um do outro, em vista de se atingir o efeito prático que justifica a existência jurídica do contrato”, registrou a decisão. Com o apelo desprovido foi mantida a sentença que negou as cobranças do locador.
Processo n. 0686595-30.2021.8.04.0001
Classe/Assunto: Apelação Cível / Equilíbrio Financeiro
Relator(a): Airton Luís Corrêa Gentil
Comarca: Manaus
Órgão julgador: Terceira Câmara Cível
Data do julgamento: 08/11/2024