O Tribunal de Justiça do Amazonas decidiu manter a condenação do Banco Bradesco ao pagamento de R$ 10 mil em danos morais, após a instituição bancária realizar cobrança indevida em uma ação de busca e apreensão de veículo.
A relatora do caso, Desembargadora Maria das Graças Pessoa Figueiredo, destacou que o cliente, inicialmente réu, conseguiu comprovar que não havia mora, e ao reconvir no processo, obteve sentença equilibrada, dentro dos parâmetros exigidos da Justiça Cível.
O caso teve início quando o Banco Bradesco propôs uma ação de busca e apreensão, alegando que o cliente estava em atraso com o pagamento de duas parcelas de um financiamento de veículo. Em uma primeira análise, o juiz acatou o pedido do banco e decretou a medida cautelar de busca e apreensão do automóvel.
No entanto, o cliente contestou, alegando que os boletos estiveram em dia, pois, na verdade, optou, por meio de uma proposta do próprio Banco, uma prorrogação de parcelas.
Ao reconvir, ou seja, ao transformar sua condição de réu em autor contra o banco, o cliente conseguiu comprovar que havia solicitado a prorrogação das parcelas anteriores e havia procedido, também, ao pagamento das duas parcelas subsequentes.
Embora o banco tenha tentado argumentar que esse pagamento havia sido realizado “em saltos”, ou seja, quitação de parcelas posteriores sem relação direta com as pendentes, o cliente declarou que a prorrogação foi uma opção formal ofertada pelo próprio Banco.
Na sentença, o juiz considerou a argumentação do cliente, que comprovou por meio de documentos e correspondências com o banco que as parcelas cobradas foram prorrogadas, em harmonia com as medidas emergenciais do ano de 2020, quando os principais bancos do país, incluindo o Bradesco, ofereceram essa possibilidade devido à crise causada pela pandemia.
O banco, por sua vez, insistiu que o cliente não havia cumprido com suas obrigações de pagamento, reiterando o “atraso”. A decisão foi favorável ao cliente, com a revogação da liminar e ordem para a devolução do veículo. No entanto, o Bradesco tinha feito a transferência do automóvel para outra pessoa.
Com isso, o juiz determinou ao Banco o pagamento, a favor do cliente, de uma multa equivalente ao valor do veículo, com base na tabela FIPE, com um adicional de 50% sobre o valor original do financiamento, por conta da alienação indevida. Também foi incluída uma indenização por danos morais no valor de R$ 10 mil, considerando-se os prejuízos causados pela apreensão do veículo, que ocorreram sem as formalidades exigidas.
O Banco Bradesco recorreu dessa decisão, trazendo à tona três questões principai que foram reexaminadas no julgamento de segunda instância: a comprovação da mora por parte do cliente; a aplicação da multa do Decreto-Lei 911/69; e a legitimidade da condenação por danos morais.
Ao analisar o recurso, o Tribunal de Justiça do Amazonas, através do voto da relatora, a Desembargadora Maria das Graças Pessoa Figueiredo, concluiu que a mora não esteva, deveras, ajustada, pois as parcelas foram pagas conforme a prorrogação acordada com o próprio banco. Desta forma, o processo de apreensão do bem foi considerado indevido.
Além disso, o Tribunal reafirmou a validade da multa prevista no §6º do art. 3º do Decreto-Lei 911/69, uma vez que o banco alienou o veículo após a propositura da ação e antes da decisão final.
A relatora também entendeu que as astreintes (multas diárias) deveriam ser afastadas, já que o bem já havia sido vendido, tornando a obrigação de devolução do veículo impossível de ser cumprida.
Por fim, foi mantida a condenação do bradesco ao pagamento de danos morais, considerando-se a apreensão indevida do veículo, uma vez que se confirmou o entendimento de que o cliente não esteve em atraso com seus pagamentos.
O TJAM concluiu que a apreensão do veículo só seria justificada caso houvesse a comprovação de atraso nas parcelas. Como isso não aconteceu, o Banco Bradesco foi responsabilizado pelos danos causados. A decisão também confirmou a repetição do indébito, uma vez que foi comprovado o pagamento das parcelas.
A tese do julgamento foi clara: a mora precisa ser comprovada para fundamentar a busca e apreensão de um bem; a multa do Decreto-Lei 911/69 é devida quando o bem apreendido foi posteriormente alienado; e as astreintes são incabíveis quando impossível o cumprimento da decisão.
Processo n. 0728386-13.2020.8.04.0001
Classe/Assunto: Apelação Cível / Alienação Fiduciária
Relator(a): Maria das Graças Pessoa Figueiredo
Comarca: Manaus
Órgão julgador: Primeira Câmara Cível