A Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça, com voto do Desembargador Paulo César Caminha e Lima, do TJAM, consolidou entendimento sobre a responsabilização de empresas com marcas de renome internacional, aplicando a teoria do fornecedor aparente em caso de danos decorrentes de fraudes em plataformas digitais.
Em julgamento de apelações, o colegiado definiu que tais empresas são solidariamente responsáveis pelos prejuízos ao consumidor, ainda que não participem diretamente do ato de cobrança, se não adotarem medidas mínimas de segurança em suas plataformas.
No caso analisado, a Apple Computer Brasil Ltda recorreu contra a sentença que declarou a inexistência de contrato de compra na Apple App Store, reconhecendo a inexigibilidade das cobranças oriundas desse contrato. O juízo de primeira instância havia determinado a devolução em dobro dos valores cobrados indevidamente e fixado uma indenização por danos morais no valor de R$ 1.000,00, responsabilizando solidariamente a Apple e o Banco BV Leasing.
Os argumentos das partes
A Apple alegou ilegitimidade passiva, justificando que apenas comercializa equipamentos no setor varejista e que a gestão dos serviços da loja virtual é atribuída a uma empresa distinta, sediada nos Estados Unidos. Para a recorrente, a responsabilidade pela prevenção de fraudes em transações financeiras caberia exclusivamente à instituição bancária, que possui acesso ao histórico de uso do cliente e capacidade de identificar irregularidades.
O consumidor, autor da ação, relatou que seu cartão de crédito foi utilizado por terceiros para compras fraudulentas na plataforma, gerando cobranças indevidas e prejuízos financeiros. Ele pleiteou a reparação pelos danos sofridos, pedido que foi atendido em primeiro grau.
Decisão do TJAM
A Primeira Câmara Cível manteve a legitimidade passiva da Apple com base na teoria do fornecedor aparente, considerando que a marca ostenta renome internacional, o que leva o consumidor a associá-la diretamente à comercialização e à gestão dos serviços oferecidos em sua plataforma.
De acordo com a decisão, o fornecedor aparente em prol das vantagens da utilização de marca internacionalmente reconhecida, não pode se eximir dos ônus daí decorrentes, em atenção à teoria do risco da atividade adotada pelo Código de Defesa do Consumidor.
Dessa forma, reconhece-se a responsabilidade solidária do fornecedor aparente para arcar com os danos causados pelos bens comercializados sob a mesma identificação, tais como nome/marca, de modo que resta configurada sua legitimidade passiva para a respectiva ação de indenização em razão do fato ou vício do produto ou serviço,definiu o acórdão.
Ademais, os magistrados entenderam que a Apple não adotou medidas mínimas de segurança para confirmar a titularidade do cartão utilizado nas compras realizadas em sua loja virtual, infringindo o princípio da boa-fé objetiva, previsto no Código de Defesa do Consumidor (CDC). Por isso, confirmaram a devolução solidária e em dobro dos valores cobrados indevidamente, conforme o art. 42, parágrafo único, do CDC.
Quanto aos danos morais, o relator destacou que não se configuram automaticamente (in re ipsa) em casos de fraude de cartão de crédito. Para a condenação, é necessária a comprovação de ofensa significativa aos direitos da personalidade do ofendido. Assim, o colegiado excluiu a condenação ao pagamento de R$ 1.000,00 por danos morais.
Tese fixada
A decisão fixou importantes teses jurídicas:
Responsabilidade baseada na teoria do fornecedor aparente: A empresa que ostenta marca de renome internacional é solidariamente responsável pelos danos decorrentes de produtos ou serviços comercializados em sua plataforma, independentemente de atuação direta no ato de cobrança.
Devolução em dobro de valores: É cabível nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC, quando o fornecedor age em desacordo com a boa-fé objetiva e não adota precauções contra fraudes.
Danos morais: Não são presumidos em casos de fraude com cartão de crédito, sendo necessária a comprovação de agravamento significativo dos direitos da personalidade do consumidor.
Processo n. 0530911-44.2023.8.04.0001
Relator(a): Paulo César Caminha e Lima
Comarca: Manaus
Órgão julgador: Primeira Câmara Cível