A exclusão das receitas próprias do Judiciário do novo arcabouço fiscal, decidida por unanimidade pelo Supremo Tribunal Federal (STF), motivou a equipe econômica do governo Lula a estudar a readequação técnica do limite de gastos desse Poder, com base na própria lógica adotada pela Corte.
A proposta em avaliação no Ministério da Fazenda prevê o recalculo do teto de gastos do Judiciário, com exclusão retroativa dessas receitas da base de cálculo de 2023, que é usada como referência para os limites futuros do novo regime fiscal. O objetivo é evitar um efeito inflacionado no teto que permita ao Judiciário executar até R$ 3,2 bilhões em despesas fora do limite, sem a devida compensação orçamentária.
A medida não revê a decisão do Supremo, mas usa a tese fixada pela Corte como fundamento técnico para evitar uma “dupla contagem”: as receitas próprias não entram mais no teto de execução, logo, também não devem compor o parâmetro de origem do limite. Dessa forma, o governo pretende conter os impactos fiscais da decisão sem violá-la, reduzindo a necessidade de buscar receitas adicionais para equilibrar o Orçamento de 2025.
A decisão que deu origem ao impasse foi proferida pelo STF no julgamento da ação ajuizada pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), com relatoria do ministro Alexandre de Moraes. A entidade sustentou que a Lei Complementar nº 200/2023, que institui o novo arcabouço fiscal, impunha uma limitação inconstitucional à autonomia financeira do Poder Judiciário, ao submeter ao teto despesas custeadas com receitas próprias, como custas processuais, emolumentos e convênios.
O plenário da Corte formou maioria unânime (11 votos a 0) para reconhecer a inconstitucionalidade da inclusão dessas despesas no teto de gastos, alinhando-se ao argumento de que o Judiciário não pode ser tratado como unidade administrativa do Executivo, especialmente quanto aos seus recursos autogerados.
Além disso, a AMB apontou que a própria legislação do arcabouço já exclui dessas limitações orçamentárias outras instituições públicas que também atuam com receitas vinculadas, como universidades federais, hospitais universitários, escolas militares e entidades científicas.
Com base nesse mesmo raciocínio, o governo agora busca aplicar a exclusão das receitas próprias não apenas na ponta da execução, mas também na base de cálculo do limite anual, criando uma contenção técnica ao impacto fiscal da decisão do STF — uma espécie de “reação com base no próprio precedente”.
A iniciativa revela uma forma sofisticada de reacomodação institucional diante das autonomias constitucionais dos Poderes e do desafio permanente de manutenção da responsabilidade fiscal sob o novo regime do arcabouço.