Moradora alegou prejuízos físicos e materiais com falta de energia que ocorreu até quatro vezes ao dia, mas juiz entendeu que a demanda exigiu complexidade incompatível com o rito do Juizado Especial. Embargos também foram rejeitados.
Em Borba, município do interior do Amazonas, uma moradora ingressou com ação judicial contra a concessionária Amazonas Energia alegando sofrer interrupções diárias de energia elétrica, de três a quatro vezes por dia, em um cenário de descaso generalizado no fornecimento do serviço essencial.
Segundo a autora, no dia 11 de abril de 2024, uma queda de energia se prolongou por 12 horas, deixando-a sem condições de utilizar eletrodomésticos básicos como o ventilador — imprescindível diante do calor tropical da região.
Ela relatou ter sofrido náuseas e dores de cabeça devido ao calor extremo e também a perda de alimentos perecíveis com o descongelamento de sua geladeira, sem qualquer suporte da concessionária.
Apesar da narrativa dramática e da argumentação jurídica de que a falha na prestação de serviço essencial gera dano moral in re ipsa — ou seja, presumido, sem necessidade de prova adicional —, o Juizado Especial Cível de Borba, sob a condução do juiz Laossy Amorim Marquezini, extinguiu o processo sem julgamento do mérito.
O magistrado baseou sua decisão no Enunciado nº 139 do FONAJE, que exclui da competência dos Juizados Especiais as ações que tratam de direitos individuais homogêneos de natureza multitudinária, ou seja, que afetam várias pessoas em situação semelhante. Segundo ele, o caso exigiria uma produção de provas mais robusta, incompatível com o rito célere e simplificado dos Juizados.
A autora não se conformou e apresentou embargos de declaração, sustentando que sua pretensão era individual, e que as Turmas Recursais do Amazonas já reconhecem a possibilidade de ajuizamento de ações dessa natureza mesmo no âmbito dos Juizados. Citou ainda jurisprudência que reconhece a ocorrência de dano moral indenizável em situações similares.
No entanto, o juiz novamente rejeitou o pedido, afirmando que os embargos não se prestam à rediscussão do mérito da sentença, e que não houve omissão, contradição ou obscuridade a ser sanada.
“A insurgência da embargante deve ser manejada pela via recursal própria”, pontuou o magistrado, mantendo a decisão de extinguir o processo com base no art. 51, inciso II, da Lei 9.099/95.
Com isso, a consumidora de Borba ficou sem análise de seu pedido de indenização por danos morais e materiais decorrentes da interrupção prolongada de energia elétrica — realidade vivenciada por diversos moradores da região.
A decisão reacende o debate sobre os limites da atuação dos Juizados Especiais em situações de interesse coletivo com impacto individual e coloca em xeque o acesso à Justiça para pessoas que vivem em cidades do interior, onde as falhas no fornecimento de serviços públicos são constantes, mas o aparato judicial é mais restrito.
Para o Judiciário do Município, não cabe ao JEC juglar indenização por corte de energia.
Processo: 0600605-72.2024.8.04.3200
Classe Processual: Procedimento do Juizado Especial Cível
Assunto Principal: Fornecimento de Energia Elétrica