Em ações indenizatórias decorrentes de falecimento, é comum que o companheiro sobrevivente necessite comprovar a existência de união estável com o falecido para legitimar seu direito à indenização.
O companheiro sobrevivente tem a possibilidade de comprovar a união estável no curso da própria ação indenizatória, sem a necessidade de um processo separado para esse reconhecimento. Significa que a declaração da união estável pode ocorrer dentro da própria ação principal, sem a necessidade de um processo autônomo específico para esse fim, como no caso da ação em que se narra o acidente letal por choque de energia elétrica com culpa da Amazonas Energia.
Com essa disposição, decisão da Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM), reformou sentença da 20ª Vara Cível que havia extinguido, sem solução de mérito, ação indenizatória proposta pela viúva de um homem que faleceu em um acidente de eletrocussão. Foi Relatora a Desembargadora Onilza Abreu Gerth.
A decisão não apenas reconheceu a união estável da autora com a vítima, mas também garantiu à viúva o direito à indenização por danos morais devido à morte do companheiro face ao choque com fios de alta tensão, e estabeleceu o pagamento de pensão mensal, com reconhecimento da responsabilidade objetiva da Amazonas Energia.
Contexto do Caso
A autora havia solicitado indenização por danos morais e pensão mensal vitalícia em razão do falecimento do seu companheiro, que, ao caminhar por um acostamento de rodovia AM-070, no Amazonas, pisou acidentalmente em um fio de alta tensão e faleceu.
O acidente fatal foi atribuído à falha na prestação dos serviços pela concessionária de energia elétrica responsável pela manutenção da rede elétrica. Entretanto, na decisão inicial, o juiz da 20ª Vara Cível de Manaus determinou a extinção da ação, alegando que a autora não havia demonstrado a legitimidade necessária para pleitear o benefício, uma vez que não comprovou a união estável com o falecido.
A decisão do TJAM e o Reconhecimento Incidental da União Estável
Ao analisar a apelação, a Desembargadora Onilza Abreu Gerth se debruçou sobre a comprovação da união estável e afirmou que a autora, mesmo sem uma certidão formal, conseguiu demonstrar, por meio de provas diversas, que convivia de forma pública, contínua e duradoura com o falecido, conforme os requisitos exigidos pela legislação para o reconhecimento do instituto. Em seu julgamento, a magistrada destacou a possibilidade de reconhecimento incidental da união estável para fins de legitimidade na ação de indenização.
Esse reconhecimento foi decisivo para dar continuidade ao processo, pois atendeu à condição básica para a autora pleitear os danos morais e o pensionamento. Segundo a decisão, em se tratando de famílias de baixa renda, é presumida a dependência econômica entre os membros, o que reforça a necessidade de suporte financeiro contínuo, como a pensão solicitada.
Responsabilidade Civil Objetiva e Pensão Mensal
Além do reconhecimento da união estável, o tribunal apontou a falha na prestação de serviços pela concessionária de energia elétrica. A Desembargadora Onilza Abreu Gerth ressaltou que a responsabilidade civil objetiva da concessionária estava configurada, uma vez que a morte da vítima foi resultado direto da negligência no serviço de distribuição de energia. Assim, a indenização foi imposta como medida de reparação aos danos sofridos pela autora.
A decisão determinou a condenação da concessionária ao pagamento de R$ 100.000,00 (cem mil reais) a título de danos morais, além de estabelecer o pagamento de pensão mensal de um salário mínimo a ser paga à autora, até que completasse 75 anos e 6 meses, ou até seu falecimento, o que ocorrer primeiro.
Tese Jurídica
A tese de julgamento consolidada pelo acórdão é clara e significativa para o entendimento de temas relacionados ao reconhecimento de união estável e à responsabilidade das concessionárias de serviços essenciais. Em sua fundamentação, o TJAM frisou:
O reconhecimento de união estável para efeitos de legitimidade ativa na ação de indenização, quando comprovada convivência pública, contínua e duradoura, sem necessidade de formalização extrajudicial é possível de forma incidental.
A responsabilidade civil objetiva de concessionária de energia elétrica em caso de falha que cause dano fatal ao consumidor ocorre sem a necessidade de prova de dolo ou culpa da empresa, mas sim pela falha na prestação do serviço.
O caso também corrobora a jurisprudência de que a dependência econômica em famílias de baixa renda é presumida, o que facilita a concessão de benefícios como pensão, proporcionando uma base sólida para a reintegração financeira dos dependentes sobreviventes.
Processo n. 0614732-14.2021.8.04.0001
Classe/Assunto: Apelação Cível / Direitos da Personalidade
Relator(a): Onilza Abreu Gerth
Comarca: Manaus
Órgão julgador: Segunda Câmara Cível
Data de publicação: 20/01/2025