Uma interrupção dos serviços de cirurgia vascular nas unidades de saúde pública de urgência e emergência do Estado, por quatro dias, no mês de setembro de 2017, denunciada pelo Ministério Público do Amazonas, por meio de ação civil pública naquele mesmo ano, encontrou encerramento em decisão do Ministro Luiz Fux, do STF, que negou ao Amazonas Recurso Extraordinário contra decisão do TJAM que condenou o Estado por danos sociais coletivos arbitrados em R$ 1 milhão.
A paralisação dos serviços de cirurgia vascular no Estado do Amazonas, no ano de 2017, serviu de causa de pedir para restabelecimento de serviços e indenização por danos sociais coletivos, com pedido levado à Justiça local por meio da então titular da Promotoria de Justiça de Defesa dos Direitos Humanos, Silvana Nobre de Lima Cabral, do MPAM.
Com atuação da Promotoria, o Juiz Leoney Figliuolo, da Vara da Fazenda Pública, definiu que houve, no ano indicado, omissão do Estado na obrigação de garantir a continuidade da prestação de serviços de cirurgia vascular em unidades do Hospital e Pronto Socorro 28 de Agosto, Hospital e Pronto Socorro João Lúcio Pereira Machado, Hospital e Pronto Socorro da Criança da Zona Leste (Joãozinho)e Hospital e Pronto Socorro Dr. Aristóteles Platão Bezerra de Araújo. O pedido de indenização por danos sociais coletivos foi negado pelo Juiz.
Recurso de Silvana Nobre se opôs à sentença apontando que o Juiz não enfrentou na decisão o pedido de indenização por danos sociais coletivos. A representante do Ministério Público ponderou que, com a decisão do Juiz, não foi analisado o pedido para que o Estado do Amazonas apresentasse a relação de todos os pacientes que foram prejudicados com a interrupção do serviço de cirurgia vascular, bem como não foram expressamente objetos de exame os dispositivos constitucionais e legais invocados para fins de prequestionamento.
No TJAM, se reconheceu que o Estado somente voltou a prestar os serviços após a ação do Ministério Público, com decisão do Juiz que impôs multa pelo não cumprimento das medidas afetas ao sistema de saúde, e que a omissão estatal gerou prejuízos que mereceriam reparos de ordem social coletiva.
Com decisão da Terceira Câmara Cível, o Colegiado concluiu que conduta do ente público foi extremamente danosa à coletividade pois rebaixou os níveis de qualidade de vida da população amazonense, ao permitir a instalação de verdadeiro quadro caótico na saúde pública, deixando os cidadãos, sobretudo os das camadas mais pobres, desamparados e em situação de constante violação a seus direitos fundamentais. Condenou-se o Estado em R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), valor a ser destinado a fundo específico de saúde.
Após a decisão do Colegiado da Terceira Câmara Cível o Estado interpôs diversos recursos, dentre os quais embargos de declaração, além de Recursos Especial ao STJ , e o Recurso Extraordinário ao STF.
Com decisão de 21/11/2024, o Ministro Luiz Fux do STF, no exame do apelo especial do Estado fixou que não cabe o recurso extraordinário quando o acórdão recorrido deu determinada qualificação jurídica a fatos delituosos e se pretende atribuir aos mesmos fatos outra configuração, quando essa pretensão exige reexame de provas. O recurso foi desprovido.
Prevaleceu a tese defendida por Silvana Nobre de que em apenas um dia que fique suspenso serviços essenciais de saúde, a falha é suficiente para acarretar danos aos pacientes que necessitam diariamente de atendimento de urgência ou emergência, por exemplo, aqueles que chegam ao hospital em consequência de ferimento por arma de fogo e arma branca, bem como aqueles que estiveram com os procedimentos agendados. Afinal, esse tipo de serviço público é contínuo e ininterrupto.
Danos sociais podem ser conceituados como sendo aqueles que geram uma diminuição na qualidade de vida da sociedade, ou engendram sensação geral de intranquilidade, sendo sempre atribuíveis a condutas socialmente reprováveis, neste caso, do ente público. Os direitos protegidos são difusos (pertencem a uma coletividade indeterminada de pessoas) e eventual indenização, de caráter punitivo, será destinada à coletividade,por meio dos fundos a que alude a Lei n.º 7.347/1985.
RE 1444219 / AM – AMAZONAS
RECURSO EXTRAORDINÁRIO
Relator(a): Min. LUIZ FUX
Publicação: 21/11/2024