O Ministério Público Federal (MPF) promoveu reunião com representantes da Secretaria de Estado da Saúde do Amazonas (SES/AM), da Policlínica Codajás, da Procuradoria-Geral do Estado, do Comitê Estadual de Saúde LGBTQIA+, da Associação de Travestis, Transexuais e Transgêneros do Amazonas (Assotram) e da Secretaria Municipal de Saúde (Semsa) para garantir assistência especializada e universal à população transexual no estado.
O encontro, realizado em 6 de fevereiro, discutiu os entraves para a habilitação da Policlínica Codajás como referência no atendimento integral às pessoas transexuais. Na ocasião, foram expostas as falhas na implementação da política pública de saúde voltada à população trans, destacando que o Estado do Amazonas adotou apenas parte das medidas recomendadas pelo MPF.
A recomendação, que previa ações para garantir a oferta de atendimento ambulatorial e hospitalar especializado, ainda não foi plenamente cumprida por problemas burocráticos, como o indeferimento de licença sanitária, itens pendentes relativos à licença ambiental e necessidade de conclusão do projeto de pânico e incêndio.
Outro ponto crítico discutido foi a demora na regulação de cirurgias de redesignação de gênero pelo sistema de Tratamento Fora do Domicílio (TFD). Conforme relatos da Assotram, pacientes trans enfrentam um tempo médio de espera de até dez anos, além de dificuldades para acionar o serviço por falta de informações claras e entraves burocráticos para acesso às cirurgias.
A Assotram apontou a urgência de se instituir um processo transexualizador único e padronizado, que proporcione maior eficiência e reduza os desgastes vivenciados pelos usuários do sistema.
Medicamentos hormonais – A reunião também abordou a disponibilização de medicamentos hormonais, incluindo a oferta de testosterona adequada, o estradiol puro e a disponibilização de hormônios orais para travestis e pessoas trans que fazem uso de silicone.
O procurador da República Igor Jordão Alves destacou a recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 787, que possibilita o acesso de mulheres trans aos medicamentos oferecidos pelo Programa Saúde da Mulher. “O STF reafirmou o direito de acesso da população trans às especialidades médicas, com uma abordagem que observe não somente a identidade de gênero, mas também o atendimento às demandas biológicas.
A implementação das exigências formuladas pelo MPF configura um dever primário do ente público na proteção e na garantia de direitos de populações historicamente vulneráveis e marginalizadas”, ressaltou. Ele avalia que, mesmo com a expedição da recomendação e a realização de outras reuniões promovidas pelo MPF, o estado do Amazonas obteve poucos avanços quando se trata da integração sanitária LGBTQIA+.
Encaminhamentos e prazos – Ao final do encontro, a SES/AM se comprometeu a solucionar, em até 60 dias, as pendências burocráticas para a habilitação do módulo ambulatorial da Policlínica Codajás e apresentar um novo cronograma para a oferta do serviço.
A secretaria também deve revisar os protocolos farmacêuticos, na sua esfera de competência, especialmente no fornecimento de testosterona melhor adaptável à individualidade de cada paciente, disponibilização do estradiol puro em detrimento do combinado e de hormônios orais para travestis/pessoas trans que fazem uso de silicone.
Em relação ao TFD para a população trans, a SES/AM se comprometeu a revisar o fluxo de atendimento e a analisar a possibilidade de implementar um processo transexualizador único, reduzindo a burocracia e evitando que pacientes tenham que iniciar um novo processo a cada procedimento, repetindo exames já realizados anteriormente.
O Ministério da Saúde será oficiado para prestar informações, no prazo de 30 dias, sobre o atual estágio do Programa de Atenção à Saúde da População Trans (Paes Pop Trans) e sobre a possibilidade de mulheres trans, no âmbito do Programa Saúde da Mulher, receberem hormônios oferecidos pela rede de assistência básica municipal.
Será expedido ofício à Prefeitura de Manaus para que informe as providências tomadas para revisão do protocolo farmacêutico na sua esfera de competência, considerando as especificidades mencionadas na reunião, com ênfase no fornecimento de hormônios e outros medicamentos auxiliares ao processo transexualizador, inclusive no âmbito do Programa Saúde da Mulher.
O MPF reforçou que seguirá monitorando a situação e que a omissão no cumprimento dos prazos poderá levar a novas medidas legais para garantir a efetivação dos direitos dessa população. A apuração de possível deficiência nos serviços de atenção especializada à saúde de pessoas transexuais no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) ocorre no âmbito do Inquérito Civil nº 1.13.000.001113/2019-37.