AGU pede ao STF a derrubada do limite para precatórios para ‘despedalar’ dívidas judiciais

AGU pede ao STF a derrubada do limite para precatórios para ‘despedalar’ dívidas judiciais

A Advocacia-Geral da União (AGU) encaminhou ao Supremo Tribunal Federal (STF) manifestação na qual pede a declaração parcial de inconstitucionalidade das emendas constitucionais nº 113/21 e nº 114/21, que criaram um teto anual para as despesas com o pagamento de precatórios até 2027, e obrigaram a União a aceitar os créditos oriundos das decisões judiciais transitadas em julgado como pagamento em um conjunto de situações, como outorgas de concessões de serviços e aquisição de imóveis públicos.

A manifestação foi feita no âmbito das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) nº 7047-DF e 7064-DF. A primeira foi movida pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT). A segunda, por um conjunto de entidades da sociedade civil (Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Associação dos Magistrados Brasileiros, Confederação dos Servidores Públicos do Brasil, Confederação Nacional dos Servidores e Funcionários Públicos das Fundações, Autarquias e Prefeituras Municipais, Confederação Nacional das Carreiras Típicas de Estado e Confederação Brasileira de Trabalhadores Policiais Civis) para questionar a constitucionalidade das normas.

Elaborada com base em nota técnica do Ministério da Fazenda, por meio da Secretaria do Tesouro Nacional (STN) e da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), a petição da AGU destaca que as emendas constitucionais não só afrontam princípios constitucionais, como geram grave desequilíbrio para as contas públicas.

Espaço fiscal artificial

A manifestação da AGU encaminhada ao STF destaca que, muito embora o governo anterior tenha utilizado como justificativa para a aprovação das emendas o risco de colapso administrativo caso fosse pago o valor integral dos precatórios previstos para 2022 – estimado em R$ 89,1 bilhões, R$ 33,7 bilhões a mais que no ano anterior – logo após a abertura artificial e temporária de espaço fiscal proporcionada pela a aprovação de ambas as emendas “foram criadas despesas obrigatórias com a estimativa de custo adicional de R$ 41 bilhões ao ano”.

Com o auxílio da nota do Ministério da Fazenda, a AGU também alerta que o novo regime de precatórios não só produziu “um volume significativo e crescente de despesa artificialmente represada” que só deverá começar a ser paga em 2027, como “não veio acompanhada de qualquer perspectiva de solução com vistas a equacionar o passivo que será acumulado a médio e longo prazo, de sorte a viabilizar seu pagamento efetivo após a data final estabelecida para a vigência do referido regime”. Dessa forma, ressalta a AGU na manifestação, a “permanência do atual sistema de pagamento de precatórios tem o potencial de gerar um estoque impagável, o que resultaria na necessidade de nova moratória”.

A AGU lembra ainda que, em julgamentos anteriores, o STF já reconheceu a inconstitucionalidade de emendas constitucionais semelhantes, que estabeleciam o pagamento parcelado de precatórios (ADI nº 2356) ou prorrogavam o prazo para seu pagamento (ADIs nº 4357 e 4425). “De fato, o atual regime especial de precatórios recria, ainda que sob nova roupagem, a figura da moratória na quitação dos débitos judiciais da Fazenda Pública, a qual já havia sido contemplada pelas Emendas Constitucionais nº 30/2000 e nº 62/2009, declaradas inconstitucionais por esse Supremo Tribunal Federal”, destaca trecho da manifestação.

Para a AGU, o regime transitório instituído pelas emendas afronta princípios constitucionais como o da razoável duração do processo, da moralidade administrativa, da efetividade da prestação jurisdicional e do acesso à Justiça, entre muitos outros. “Essa ofensa constitucional é potencializada pelo fato de o novo regime de precatórios não vir sequer acompanhado de mecanismos que garantam o pagamento do passivo acumulado ao final de seu prazo de vigência. Essa lacuna normativa reforça o risco de descumprimento pelo Poder Público de tais obrigações a partir do exercício de 2027, o que poderia fomentar nova prática de prorrogação de prazo para além dessa data, eternizando-se assim tal moratória”, acrescenta a Advocacia-Geral.

Contas mascaradas

Segundo a AGU, a suspensão do pagamento integral dos precatórios trouxe um “falso alívio fiscal imediato” que, por outro lado, coloca em risco a sustentabilidade fiscal de longo prazo e ainda mascara artificialmente a situação das contas públicas, uma vez que as despesas com precatórios adiadas não entram nas estatísticas da dívida pública anuais e são postergadas para o exercício em que o passivo terá que ser efetivamente quitado, em 2027. De acordo com a nota técnica dos órgãos econômicos, “a relevância desse ‘mascaramento’ pode ser explicada pelos números do exercício de 2022: fossem as despesas exigíveis com precatórios honradas em dia, tudo o mais constante, o ano de 2022 teria praticamente apontado déficit primário, e não superávit primário de R$ 54,1 bilhões, como oficialmente divulgado”.

Planejamento orçamentário

Já em relação à possibilidade de utilização de precatórios para realizar pagamentos para a União, introduzida pela Emenda Constitucional nº 113, de 2021, a AGU aponta que a medida, adotada justamente como uma forma de compensar o adiamento do pagamento das obrigações judiciais, caso efetivada, tornaria imprevisível a disponibilidade financeira da União, na medida em que subtrai do governo o controle sobre o momento de liquidação de suas dívidas ou obrigações decorrentes de decisões judiciais, inviabilizando, assim, o seu planejamento orçamentário e financeiro.

Solução

Por fim, no caso de reconhecimento da inconstitucionalidade das emendas constitucionais, a AGU pede para o STF autorizar o governo a abrir crédito extraordinário para quitar o passivo do regime de precatórios criado pelas normas, distinguindo o valor principal dos títulos (que devem continuar sendo considerados despesas primárias) dos encargos financeiros oriundos da incidência de juros e correção monetária (que, como despesas financeiras, não devem estar sujeitas ao limite de resultado primário previsto no novo regime fiscal, tal como os encargos sobre os títulos da dívida pública não o são).

“Cumpre destacar que a apontada inconstitucionalidade da instituição de um teto de precatórios, bem como o pedido de inconstitucionalidade por arrastamento da obrigação da União em implementar a compensação nos termos do § 11 do artigo 100 da Constituição Federal, objetivam essencialmente garantir a concretização dos princípios da responsabilidade fiscal e da segurança jurídica, pilares fundamentais para a estabilização econômica do país e consequente desenvolvimento social, como determinado pela Constituição de 1988”, conclui a AGU na manifestação.

Regulamentação

Com o pedido de declaração de inconstitucionalidade do regime transitório de precatórios criado pelas emendas constitucionais nº 113 e nº 114, a AGU suspende a elaboração de uma nova regulamentação para uso dos créditos nas hipóteses previstas no art. 100, § 11, da Constituição Federal – como aquisição de imóveis da União ou pagamento de outorgas pela exploração de serviços públicos. A decisão foi tomada justamente após os órgãos técnicos da área econômica apontarem que o passivo criado pelas mudanças nas regras só poderia ser equacionado por meio de declaração de inconstitucionalidade das normas e sua consequente retirada do ordenamento jurídico.

“Analisamos os argumentos do Ministério da Fazenda e chegamos à conclusão de que a questão dos precatórios precisa de uma solução estrutural e definitiva. Afastar as emendas constitucionais vai trazer segurança jurídica e resgatar a credibilidade do regime constitucional de pagamentos desses créditos, que sempre funcionou. Todos ganharão”, conclui o advogado-geral da União, Jorge Messias.

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