A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho manteve a condenação da Agropecuária BJ do Guaporé, em Vila Bela da Santíssima Trindade (MT), a pagar indenização de R$ 50 mil à mãe de um vaqueiro que teve morte instantânea ao ser atingido por raio durante uma tempestade. A empresa alegava que se tratava de caso fortuito, mas, ao rejeitar seu recurso, o colegiado entendeu que houve negligência do capataz da fazenda, que deveria ter suspendido as atividades durante a tempestade.
Temporal
O vaqueiro morreu um dia após ser contratado, em janeiro de 2019, para trabalhar na fazenda Sagrado Coração de Jesus, a 525 quilômetros de Cuiabá. Ele estava montado a cavalo, e o animal também morreu com a descarga elétrica.
Para a mãe do trabalhador, o certo seria que, já com prenúncio de temporal, o capataz suspendesse as atividades e colocasse o filho em local coberto e seguro. Na avaliação do advogado dela, a agropecuária falhou em seu dever de assegurar a integridade física do empregado.
Campeão
Segundo o Grupo de Eletricidade Atmosférica (Elat) do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o Brasil é o país campeão mundial em incidência de raios. São cerca de 77,8 milhões por ano. A explicação, de acordo com o Elat, é geográfica, uma vez que é o maior país da zona tropical do planeta – área central onde o clima é mais quente e, portanto, mais favorável à formação de tempestades e de raios.
Em relação a mortes provocadas por raios, o Inpe afirma que só este ano 59 pessoas morreram atingidas por descargas elétricas. De acordo com o Elat, a chance de uma pessoa ser atingida por um raio na zona rural é de 1 para 1.000, dez vezes maior do que nas grandes cidades. Isso porque atividades como lavoura, plantio e manejo de gado ocorrem em campos abertos.
Ambiente perigoso
Em agosto de 2021, o Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região (MT) confirmou sentença que condenara a agropecuária a indenizar a mãe do vaqueiro por danos morais. O TRT entendeu que o ambiente de trabalho, naquelas condições, estava claramente perigoso, pois era previsível a possibilidade da queda de raios nas proximidades, como de fato ocorreu.
Caso fortuito
Diante da decisão, a agropecuária tentou rediscutir o caso no TST, defendendo a necessidade de comprovação da culpa para o pagamento da indenização. Segundo a empregadora, tratou-se de caso fortuito, situação em que não é possível prever ou adotar medidas de segurança para evitar a queda do raio. A empresa sustentou ainda que o acidente não estava ligado diretamente às atividades do vaqueiro.
Imprudência
Para o relator, ministro José Roberto Pimenta, a imprudência do capataz foi determinante para descaracterizar a tese do caso fortuito. Em seu voto, o ministro citou trecho de depoimento de testemunhas que afirmaram que o acidente poderia ter sido evitado se ele tivesse suspendido as atividades do vaqueiro.
Ao confirmar a responsabilidade objetiva, Pimenta destacou que o trabalhador trabalhava no campo e, por essa razão, estava sujeito aos riscos próprios do meio rural. “Não se pode falar em mera fatalidade ou que o empregador não teria contribuído para o infortúnio”, frisou.
Risco
O ministro lembrou que o TST vem adotando o entendimento de que o trabalho no campo, com o manejo de animais, gera a responsabilidade objetiva do empregador, em razão dos riscos inerentes a essa atividade. Ressaltou também que, de acordo com a Norma Regulamentadora 31, do Ministério do Trabalho e Emprego, o empregador rural deve, entre outras obrigações, interromper as atividades na ocorrência de condições climáticas que comprometam a segurança dos trabalhadores.
A decisão foi unânime.
Processo: AIRR-221-24.2020.5.23.0096
Com informações do TST