O delito de registro não autorizado da intimidade sexual, previsto no artigo 216-B do Código Penal, insere-se naqueles de ação penal pública incondicionada. Assim, a investigação e o oferecimento da denúncia não dependem da vontade da vítima de ver o réu processado.
Com esse entendimento, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça denegou a ordem em Habeas Corpus ajuizada por um homem que foi investigado e processado por filmar um ato sexual praticado com a namorada sem o consentimento dela.
Para a defesa, o crime do artigo 216-B do Código Penal é de ação condicionada a representação. Assim, dependeria da vontade da vítima de ver a conduta apurada e punida, intenção que deve ser manifestada no prazo de seis meses após o conhecimento do fato.
No caso julgado, a vítima soube da existência da gravação em outubro de 2019, mas só fez o boletim de ocorrência em agosto de 2020, portanto, dez meses mais tarde. Com isso, teria perdido o direito de representar contra o suspeito, o que impediria o Estado de investigar e punir a conduta.
Essa alegação, porém, já havia sido descartada pelas instâncias ordinárias. O Tribunal de Justiça de São Paulo identificou um conflito de normas, mas optou pela interpretação segundo a qual o Ministério Público não depende da vítima para fazer a persecução penal. Essa posição foi referendada pela 6ª Turma do STJ, por unanimidade de votos.
Lacuna legal
O conflito de normas sobre esse tema foi causado por uma desatenção do legislador penal.
Primeiro, a Lei 13.718/2018 alterou o artigo 225 do Código Penal para transformar todos os crimes descritos nos Capítulos I e II do Título VI — delitos contra a dignidade sexual — em crimes de ação penal pública incondicionada.
Ainda em 2018, a Lei 13.772/2018 criou o Capítulo I-A, composto exclusivamente pelo crime de registro não autorizado da intimidade sexual, mas não o incluiu no rol listado pelo artigo 225.
Assim, a lógica indicaria que esse novo delito seria de ação pública condicionada. Dependeria, portanto, da vontade da vítima de ver o autor do crime processado e punido. Essa foi a cartada usada pela defesa, que pediu, diante da lacuna legal, a interpretação mais favorável ao réu.
Relator da matéria, o ministro Sebastião Reis Júnior explicou que essa posição não pode prevalecer porque, mesmo diante da lacuna legal, a regra geral do artigo 100 do Código Penal indica que, no silêncio da lei, deve-se considerar a ação penal como pública incondicionada.
“Nesse toar, não há outra solução a não ser perfilhar do entendimento de que o delito de registro não autorizado da intimidade sexual se insere nos delitos de ação penal pública incondicionada”, concluiu o ministro. A votação foi unânime.
RHC 175.947
Com informações do Conjur