A Segunda Câmara Cível do TJAM, no exame de um agravo de instrumento, reavaliará a decisão judicial que negou ao autor o benefício da gratuidade da justiça, apesar de sua expressa declaração de hipossuficiência econômica, amparada na Lei nº 1.060/50 e reforçada pelo art. 98 do Código de Processo Civil (CPC). A decisão combatida negou a gratuidade da justiça sob o entendimento de que o autor tem emprego, renda anual superior a R$ 100 mil, e que pode pagar as despesas do processo.
O agravante reitera que nãopossui condições financeiras de arcar com as custas e despesas processuais sem prejuízo de seu sustento, notadamente por viver da renda do emprego e que os recursos auferidos são totalmente comprometidos com sus obrigações mensais. No agravo defende a modificação da decisão atacada, a fim de que lhe seja concedida a gratuidade da justiça. O julgamento virtual foi suspenso, devido a pedido de destaque para a causa, por meio de solicitação do Desembargador Yedo Simões Oliveiera, do TJAM.
Contexto legal
O art. 98 do CPC estabelece que a justiça gratuita pode ser concedida àquele que declarar não possuir condições de arcar com as custas e despesas processuais sem prejuízo de seu sustento ou de sua família. Essa declaração de hipossuficiência goza de presunção relativa de veracidade, ou seja, não pode ser afastada sem a existência de elementos concretos que demonstrem a inexistência da incapacidade financeira alegada.
Neste caso, a decisão judicial baseou-se no fato de o autor ser empregado com renda anual superior a R$ 100 mil. Contudo, não foram apresentados outros elementos que indicassem efetiva capacidade financeira de custear o processo, como despesas pormenorizadas ou o montante real dos compromissos financeiros assumidos pelo autor.
Acesso à justiça como direito fundamental
O acesso à justiça é consagrado pela Constituição Federal em seu art. 5º, inciso XXXV, que assegura que nenhuma lesão ou ameaça a direito pode ser excluída de apreciação judicial. Nesse contexto, a justiça gratuita é um importante mecanismo para evitar que as barreiras econômicas tornem inviável o pleno exercício desse direito.
O indeferimento da gratuidade em situações que carecem de análise mais profunda pode comprometer esse princípio, impondo dificuldades desproporcionais para que o cidadão litigue e defenda seus direitos. Embora seja necessário coibir abusos e fraudes, essa precaução não pode justificar uma interpretação rigorosa ao ponto de inviabilizar demandas justas.
A importância da revisão em segundo grau
A revisão dessa decisão por meio do agravo de instrumento permitirá ao tribunal examinar de forma detalhada a condição financeira do autor e a adequação do indeferimento em relação à legislação vigente. A jurisprudência brasileira tem reconhecido que a mera existência de emprego ou de renda, isoladamente, não é suficiente para afastar o direito à justiça gratuita.
Por exemplo, em situações onde as despesas pessoais e familiares consomem a maior parte da renda, o pagamento das custas judiciais pode se tornar inviável sem comprometer o sustento mínimo. A própria dinâmica econômica das diversas regiões do país é um fator que deve ser levado em conta no julgamento.
O STJ, por meio de recurso repetitivo poderá definir se é legítima a adoção de critérios objetivos para aferição da hipossuficiência na apreciação do pedido de gratuidade de justiça formulado por pessoa natural, levando em conta as disposições dos arts. 98 e 99, § 2º, do Código de Processo Civil. No Tribunal da Cidadania o tema é registrado sob o nº 1178.
No TJAM, enquanto não sobrevier uma decisão de mérito sobre a questão que, sem dúvida, formará um precedente, o agravante segue, até então, beneficiado por uma tutela de urgência, de efeitos provisórios. Decisão do Desembargador Délcio Santos considerou a probabilidade do direito, ou do provimento do recurso, isso porque o autor apresentou documentação que confirmou sua narrativa, indicando sua situação economica, extratos bancários do salário mensal,despesas com dependentes e outras provas. O autor aguarda a decisão de mérito.
Processo n. 4013261-73.2023.8.04.0000