Ocorrendo a perda do direito de punir por meio de processo regularmente instaurado pelo Ministério Público constitui-se em dever do magistrado declarar essa circunstância, se a causa da perda da pretensão punitiva for a prescrição, considerado o decurso do tempo no qual o Estado não conseguiu, tempestivamente, fazer valer seu poder-dever de aplicar uma pena a quem cometeu o crime. Porém, uma prescrição construída por hipótese de aplicação de pena não guarda previsão na legislação e tem sua utilização vedada pelo Superior Tribunal de Justiça. A afirmação se encontra em decisão relatada pelo Desembargador João Mauro Bessa, do Tribunal do Amazonas, afastando recurso de Raimundo Andrade.
A decisão se encontra em aclaratórios relatado pelo Desembargador, denegando o pedido de prescrição, embora possa ser formulado em qualquer tempo e em qualquer grau de jurisdição, mas desde que a razão de ordem pública atenda, em concreto, a espécie examinada, o que não se verificou em espécie.
“A prescrição é matéria de ordem pública, logo, cognoscível a qualquer tempo e grau de jurisdição”, mas deve ser examinada à luz do ordenamento jurídico brasileiro, não havendo amparo para a prescrição, que, no caso examinado, foi denominado de virtual ou antecipada. Nesse tipo de ‘prescrição’, o juiz trabalharia com a hipótese de uma pena aplicada por imaginação, como se houvesse permissão para um pré-julgamento, o que é vedado no direito processual e constitucional.
Ademais, há Súmula do STJ que assim dispõe sobre a matéria: “É inadmissível a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva com fundamento em pena hipotética, independentemente da existência ou sorte do processo penal”.
A prescrição, para efeito de contagem, deve obedecer aos parâmetros em abstrato definidos no código penal. A prescrição regula-se pela pena máxima em abstrato, e não por uma projeção. No entanto, a prescrição se sujeita a marcos que a possam interromper, o que permitirá a recontagem do prazo prescricional por inteiro. Hipóteses imaginárias de aplicação de pena, com adoção de raciocínio que permitiriam a conclusão de uma pena mínima, que, pelo decurso do tempo, já estaria prescrita, não é admitida no direito brasileiro.
Processo nº 0003765-25.2022.8.04.0000
Leia o acórdão:
PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO PROCESSO N.º: 0003765-25.2022.8.04.0000. RELATOR: Desembargador João Mauro Bessa PROCESSO PENAL – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EMAPELAÇÃO CRIMINAL – OMISSÃO – NÃO VERIFICAÇÃO – PRESCRIÇÃO VIRTUAL – AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL – EMBARGOS REJEITADOS. 1. Nos limites estabelecidos pelo artigo 619 do Código de Processo Penal, os embargos de declaração são cabíveis quando a decisão ou o acórdão apresentarem omissão, obscuridade, contradição ou ambiguidade. 2. Conforme preleção de NUCCI, a omissão ensejadora do oferecimento de embargos declaratórios “é a lacuna ou o esquecimento. No julgado, traduz-se pela falta de abordagem do magistrado acerca de alguma alegação ou requerimento formulado, expressamente, pela parte interessada, merecedor de apreciação”. 3. In casu, não se vislumbram as omissões apontadas, porquanto o Recurso em Sentido Estrito sequer foi conhecido, ante a sua intempestividade. 4. Com efeito, a defesa do embargante sustenta a ocorrência da prescrição virtual. Todavia, a prescrição retroativa antecipada, também conhecida como projetada, virtual, hipotética ou em perspectiva, não possui previsão legal no ordenamento jurídico pátrio, e a sua aplicação é vedada pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, inclusive com repercussão geral reconhecida no primeiro e edição da súmula 438 no segundo, segundo a qual “é inadmissível a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva com fundamento em pena hipotética, independentemente da existência ou sorte do processo penal”. 5. Embargos declaratórios rejeitados.