“Só tentei furar a vítima” disse o réu para não ser julgado por homicídio em Manaus

“Só tentei furar a vítima” disse o réu para não ser julgado por homicídio em Manaus

A alegação de que uma única facada na região torácica da vítima pretendeu apenas causar lesão corporal, sem o propósito de matar, mas que levou a pessoa à óbito, é resultado cuja voluntariedade, ou não, deve ser debatida somente pelo Tribunal do Júri – o órgão competente para o processo e julgamento dos crimes dolosos contra a vida, tentados ou consumados, como determina a Constituição Federal, na regra do artigo 5º, XXXVIII e o artigo 74,§ 1º do CPP. No caso concreto, o acusado Robson Castro tentou, por meio de recurso, a desclassificação do crime de homicídio para lesão corporal seguida de morte, o denominado crime preterdoloso. Foi Relatora Vânia Maria Marques Marinho. 

O réu não negou a autoria do crime, pois restou evidenciada, a defesa construiu a tese de que a intenção do agente era apenas lesionar a vítima, e que o resultado morte deveria, ante essa circunstância, configurar-se em lesão corporal seguida de morte, pois não teria ocorrido a premeditação do homicídio, inexistindo a intenção de matar, especialmente porque houve apenas uma facada desferida com um utensílio de cozinha. O réu confessou os fatos e disse só ter tentado furar a vítima, sem querer a morte. 

No recurso foi requerido a desclassificação de homicídio, descrito no artigo 121 do CP para o crime de lesão corporal dolosa seguida de morte, tal como descrito no artigo 129,§ 3º do Código Penal. Embora a tese tenha também sido ofertada ainda nas razões de defesa, em primeiro grau, as razões que a rejeitaram basearam-se em que, ao juízo monocrático, cumpre somente avaliar se estão presentes os elementos de autoria e que o mínimo de dúvida sobre o tema deveria ser levado a julgamento popular como determina a Constituição. 

A desclassificação pretendida não poderia ser atendida de plano, pois, caso contrário, se estaria agredindo a competência do Tribunal do Júri, como previsto na lei maior e que a não incidência do ânimo de matar somente pode ser, de plano, reconhecida em hipóteses excepcionais, o que não foi o demonstrado no caso atacado. 

Em segundo grau, a decisão foi mantida, ainda ao fundamento de que a decisão de pronúncia criminal encerra mero juízo de admissibilidade da acusação, sem qualquer avaliação de mérito, razão porque não se demanda certeza da autoria do crime, mas apenas a existência de elementos que despertem dúvida ao julgado, além de que na fase que antecede ao julgamento do júri impera o princípio de que a dúvida vigora a favor da sociedade. 

Processo nº 0000735-10.2020.8.04.5801

Leia o acórdão:

Recurso em Sentido Estrito n.º 0000735-10.2020.8.04.5801 Recorrente: Robson de Castro. Relatora: Desembargadora Vânia Marques Marinho PENAL E PROCESSO PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. HOMICÍDIO. DESCLASSIFICAÇÃO PARA LESÃO CORPORAL SEGUIDA DE MORTE. IMPOSSIBILIDADE. ANIMUS LAEDENDI NÃO CONFIGURADO. PRESERVAÇÃO DA COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI. SENTENÇA DEVIDAMENTE MOTIVADA. MANTENÇA NECESSÁRIA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. In casu, pugna-se pela desclassificação do crime de homicídio, previsto no art. 121, caput, do Código Penal, para o de lesão corporal seguida de morte, nos moldes do art  129, § 3.º do aludido diploma legal. 2. Sabe-se que a sentença de pronúncia criminal encerra mero juízo de admissibilidade da acusação, logo, não se demanda certeza da autoria do crime, mas apenas a existência de elementos que despertem dúvida ao julgador, já que nesta fase processual vigora o princípio do in dubio pro societate, em que, em caso de incerteza, o favorecimento é do Estado, cabendo ao Tribunal do Júri a competência constitucional para a apreciação meritória da pretensão penal, mediante o exame aprofundado do conjunto probatório. Precedentes. 3. No caso em tela, sobreleva-se que a prova da materialidade e os indícios de autoria extraem-se dos depoimentos das testemunhas e do laudo de exame de corpo de delito. Nessa senda, a tese de desclassificação para o crime de lesão corporal seguida de morte constitui argumento que não se sobressai de maneira incontestável frente ao conjunto probatório acostado, restando confirmada a materialidade, bem como a presença de indícios de autoria a justificar a admissibilidade da acusação. 4. Outrossim, destaca-se que em respeito ao princípio do juiz natural, somente é cabível a desclassificação para o crime de lesão corporal seguida de morte na decisão de pronúncia quando manifestamente demonstrada a ausência do animus necandi, uma vez que a decisão acerca da sua caracterização, ou não, deve ficar a cargo do Conselho de Sentença. Precedentes

 

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