STJ anula júri que condenou a ré baseado apenas em prova de motivo para o crime

STJ anula júri que condenou a ré baseado apenas em prova de motivo para o crime

Em razão da inexistência de provas de autoria, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) anulou um veredito condenatório do tribunal do júri e determinou que a ré seja submetida a novo julgamento. Segundo o relator do recurso especial, ministro Ribeiro Dantas – cujo voto foi seguido de forma unânime pela turma –, as provas apontadas pelo Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) para rejeitar a apelação da defesa e manter a condenação mostram apenas que a acusada teria um motivo, mas não que tenha cometido o crime.

Para o colegiado, se a apelação sustenta que a decisão dos jurados foi manifestamente contrária às provas dos autos (artigo 593, III, “d”, do Código de Processo Penal CPP), o tribunal de segundo grau tem o dever de analisar se pelo menos existem provas de cada um dos elementos essenciais do crime.

De acordo com o relator, o veredito condenatório manifestamente contrário ao conjunto probatório é o proferido sem que essas provas existam.

Provas apontam apenas desavença com a vítima

A ré foi condenada como mandante da morte de um homem que ocupava um imóvel adquirido por ela em leilão – fato que teria gerado desavença entre eles. O irmão dela foi condenado como executor do crime. O TJCE cassou o veredito em relação ao irmão por considerá-lo manifestamente contrário às provas, mas manteve a condenação da acusada de ser a autora intelectual do homicídio.

O ministro Ribeiro Dantas lembrou que, em geral, “a avaliação da existência ou não de prova da autoria delitiva, bem como da manifesta contrariedade entre o veredito dos jurados e as provas dos autos, exige aprofundado reexame do conjunto fático-probatório” – o que não pode ser feito pelo STJ em recurso especial, como dispõe a Súmula 7.

No caso em análise, porém, o magistrado verificou que o acórdão recorrido expôs a totalidade das provas que embasaram o resultado do júri, sendo que todas elas apontam apenas a existência de uma desavença entre a ré e a vítima. Segundo ele, não é necessário revalorar as provas, mas tão somente avaliar se a conclusão do TJCE pela manutenção do veredito decorreu dos fatos narrados pela própria corte em seu acórdão.

“Não há no acórdão recorrido a indicação de nenhum elemento concreto que sugira ser a ré autora intelectual do delito. Seu desentendimento histórico com a vítima, embora possa torná-la suspeita e impulsionar uma investigação mais detida (que não ocorreu), não autoriza presumir a autoria do homicídio”, afirmou.

Controle jurisdicional das decisões dos jurados

“Aferir a existência das provas é tarefa que cabe ao tribunal estadual ou regional, quando aprecia a apelação do artigo 593, III, ‘d’, do CPP. Se a corte local não é capaz de apontar tais provas, ou seu acórdão é omisso (nulo, portanto), ou o veredito condenatório deve ser cassado por falta de provas, ainda que o aresto recorrido o tenha mantido incólume”, declarou.

No caso em julgamento – continuou o ministro –, embora tenha feito um exame exaustivo das provas do processo, o TJCE não conseguiu apontar nenhum elemento que comprovasse a autoria do homicídio.

Ribeiro Dantas explicou que, como a legislação brasileira permite o controle jurisdicional das decisões dos jurados, a corte competente para julgar a apelação deve investigar se o veredito foi minimamente respaldado nas provas e teses apresentadas em plenário.

“Ao julgar a apelação, o tribunal não pode se imiscuir no mérito do sopesamento do conjunto probatório, mas tem a obrigação de apontar se, para cada um dos elementos do delito, existem provas de sua ocorrência, ainda que não concorde com a conclusão dos jurados a seu respeito”, observou.

Prova de motivo não é prova de autoria

O ministro ainda ressaltou que “a prova do motivo não implica necessariamente prova da autoria”. Para o magistrado, verificar a existência de um motivo e, a partir dele, considerar que a autoria está provada significa inverter a ordem lógica de valoração das provas.

“Como elemento essencial que é, primeiro se avalia a comprovação da autoria, para somente então aferir quais os motivos que impulsionaram o agente. A autoria é uma questão prejudicial, porque sua ausência torna até despicienda a descoberta dos motivos do autor, o qual permanece desconhecido para o direito”, concluiu.

Fonte: STJ

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