Advogado que rétem dinheiro de cliente de forma indevida dá causa a danos morais

Advogado que rétem dinheiro de cliente de forma indevida dá causa a danos morais

Reter indevidamente o crédito de cliente causa dano moral in re ipsa, pois são presumíveis os aborrecimentos e os transtornos decorrentes da conduta irregular. Assim entendeu a 16ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul ao condenar um advogado a indenizar uma cliente em R$ 10 mil por se apropriar de parte do dinheiro que ela deveria receber após vencer ação judicial contra o estado.

O Judiciário expediu, em favor da autora, Requisição de Pequeno Valor (RPV) de R$ 21,7 mil. Com os descontos de previdência, plano de saúde e Imposto de Renda, além das custas processuais, o valor líquido ficou em R$ 14,4 mil. O réu recebeu o valor, porém repassou à autora apenas R$ 8,6 mil, mediante depósito bancário. Ou seja, fez desconto superior a 40% do valor depositado.

Descontente, a cliente chegou a cobrar a diferença diretamente do advogado. Ele respondeu  que o montante disponibilizado, por ora, fora de aproximadamente R$ 15 mil, que sofreu os descontos de honorários. Segundo o advogado, o recebimento pelo serviço foi calculado com base no valor da causa, tendo em conta o teto da RPV, e não no valor de fato alcançado. Faltaria ainda, na versão dele, um depósito de R$ 10 mil que, uma vez liberado, seria integralmente repassado à demandante.

A autora entrou na Justiça pedindo rescisão contratual pela falta de zelo e probidade na conduta. Alegou quebra de confiança na relação de prestação de serviços advocatícios, presumindo-se os honorários contratados em 20%, como é usual pela tabela da OAB.

Citado por edital, o réu não contestou. O curador especial, por meio da Defensoria Pública, sustentou a inépcia da petição inicial, por não comprovar a contratação dos serviços profissionais. No mérito, afirmou que os honorários sequer foram cobrados com base em algum percentual. Logo, a autora não se desincumbiu do ônus de provar os danos causados, nos termos do artigo 373, inciso I, do CPC.

Ausência de má-fé
O juiz Walter José Girotto, da 17ª Vara Cível do Foro Central de Porto Alegre, reconheceu que a autora contratou o réu para atuar como seu procurador, embora não tenha acostado o contrato de prestação de serviços à inicial. 

Contudo, segundo o juiz, a mulher não apresentou elementos que permitissem concluir, cabalmente, a ocorrência da má-fé. Além disso, o réu obteve resultado favorável. ‘‘Ausente comprovação de que o demandado reteve valor que caberia à autora, porquanto sequer comprovada documental a contratação de honorários convencionais com base em percentual incidente sobre o valor da condenação, ou do proveito econômico obtido com a demanda judicial, não procede a irresignação da demandante quanto ao ponto’’, escreveu na sentença.

Girotto observou, por outro lado, que houve ‘‘inegável quebra de confiança’’ entre cliente e advogado, já que a natureza do contrato de prestação de serviços advocatícios funda-se na confiança que o contratante deposita no seu procurador. Assim, declarou a rescisão do contrato de prestação de serviços celebrado entre as partes.

Responsabilidade profissional
A relatora na do Tribunal de Justiça, desembargadora Cláudia Maria Hardt, reformou a sentença. Ela pontuou que a autora reconheceu, na petição inicial, que os honorários advocatícios poderiam ser presumidos em 20%, tal como praticado pela tabela da OAB gaúcha. Assim, cabia ao réu demonstrar ajuste em contrário – para justificar a retenção dos valores em patamar superior ao usualmente adotado em situações similares –, o que deixou de fazer.

A julgadora entendeu que o desconto foi superior ao devido, já que o procurador tem direito a 20% sobre a quantia bruta – o equivalente a R$ 4,3 mil em 23 de julho de 2012. E a diferença a ser restituída compreende o valor do alvará, acrescido dos seus respectivos rendimentos, deduzido do montante depositado na sua conta (R$ 8,6 mil) e abatido o percentual de honorários. Tudo com as devidas atualizações legais.

Além disso, segundo a desembargadora, a conduta do réu causou danos morais à cliente, mesmo sem provas do efetivo prejuízo. ‘‘A verdade é que o mandatário não cumprira com a obrigação de seu mister ao repassar à mandante o valor inferior ao crédito a que fazia jus. Configurado, portanto, o ato ilícito capaz de gerar indenização por danos morais’.” O voto foi seguido por unanimidade.

Fonte Conjur

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