Ausência de erro médico não descarta violência obstétrica, decide TJ-MS

Ausência de erro médico não descarta violência obstétrica, decide TJ-MS

O artigo 186 do Código Civil determina que aquele que, por ação ou omissão voluntária violar direito e causar dano ao outro, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Além disso, o conceito de violência obstétrica, embora próximo, não se confunde com erro médico.

Esse foi o entendimento do juízo da 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul para condenar um médico e a Santa Casa de Campo Grande a indenizar uma paciente em R$ 25 mil e em R$ 15 mil respectivamente.

A decisão foi provocada por recurso de um casal contra decisão de primeiro grau que negou a condenação do médico e do hospital ao pagamento de indenização por danos materiais, morais e estéticos provocados por erro médico.

No caso concreto, o casal alega que, por conta de gravidez de alto risco, o médico que realizou o pré-natal indicou que o parto deveria ser por meio de uma cirurgia cesariana. Na 36ª semana de gestação, a autora apresentou sangramento e entrou em contato com o médico, que determinou que ela fosse para a Santa Casa de Campo Grande.

Ao chegar no hospital, ela foi atendida por outra médica que ministrou medicamentos para que o parto não ocorresse naquele momento. Horas depois o médico que realizou o pré-natal e insistiu pelo parto normal.

Depois, ainda segundo o processo, a paciente foi encaminhada pelo plantonista à sala de cirurgia e foi submetida à “manobra de Kristeller” — um procedimento banido pelo Sistema Único de Saúde. O bebê teve parada cardiorrespiratória e teve que ser reanimado. O recém-nascido permaneceu 33 dias na UTI Neonatal e ficou com sequelas por conta de paralisia cerebral.

Ao analisar o caso, a relatora, desembargadora Jaceguara Dantas da Silva, afirmou que o laudo pericial apontou que a gravidade da lesão causada em decorrência dos problemas no parto era mínima, já que a paciente possuía sífilis durante o período gestacional e tal doença pode provocar “má-formação do feto, aborto ou morte do bebê, quando este nasce gravemente doente”.

Diante desse argumento, ela afastou o pedido de indenização por erro médico. Quanto à alegação de violência obstétrica, a relatora teve entendimento diverso.

“Isso porque a violência obstétrica está relacionada a procedimentos e condutas adotadas pela equipe médica durante o período gestacional da mulher que impliquem violação à integridade física e psicológica da parturiente, atingindo inclusive aspectos não aferidos diretamente em sua fisionomia”, argumentou.

A desembargadora explicou que esse tipo de violência não se equipara necessariamente a erro médico, na medida em que abrange condutas de apropriação do corpo das mulheres e desrespeito às suas escolhas e decisões.

“A violência obstétrica desconsidera o protagonismo da mulher durante a gestação, assim como seus direitos e sua capacidade de autodeterminação. Institucionalizam-se, sob o manto da tecnicidade, condutas antiéticas — como a não permissão de acompanhante em razões de questões técnicas — em detrimento do interesse daquela que necessita se sentir segura, confortável e ciente de todo o processo em curso”, pontuou.

Ela explicou que o fato de não termos uma legislação específica sobre violência obstétrica contribui para que o assunto encontre resistência, inclusive no âmbito da jurisprudência, mas lembrou que a proteção integral à saúde da mulher e seus direitos reprodutivos encontram respaldo constitucional.

Por fim, a julgadora também lembrou que, conforme os autos, o médico que realizou todo o pré-natal agiu de forma omissiva na medida em que, embora tenha se comprometido, não fez o parto. Também pontuou que o médico plantonista, por sua vez, admitiu a realização da manobra de Klisteller, que há tempo não é mais recomendada pelo poder público na área da saúde e provocou dores desproporcionais à paciente. Diante disso, ela entendeu existir dano moral e votou pela condenação do médico e do hospital.

Por fim, foram condenados a indenizar o médico que acompanhou o pré-Natal da paciente e o hospital, que é responsável subsidiariamente pelos atos da médica e do plantonista que acompanharam o caso.

Com informações do Conjur

 

Leia mais

OAB-AM inaugura nova subseção em Itacoatiara

A Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Amazonas (OAB-AM) inaugurou, na quinta-feira (5), uma nova Subseção no município de Itacoatiara, localizada na Avenida...

Discussão sobre terceirização ou vínculo trabalhista não afeta competência da Justiça do Trabalho

"O entendimento do Supremo Tribunal Federal acerca da possibilidade de terceirização de qualquer atividade econômica e da validade de outras formas de contratação e...

Mais Lidas

Justiça do Amazonas garante o direito de mulher permanecer com o nome de casada após divórcio

O desembargador Flávio Humberto Pascarelli, da 3ª Câmara Cível...

Bemol é condenada por venda de mercadoria com vícios ocultos em Manaus

O Juiz George Hamilton Lins Barroso, da 22ª Vara...

Destaques

Últimas

TJ-RJ anula multa aplicada a advogada por excesso de manifestações

Multas processuais não se aplicam a advogados, pois eles não são parte no processo. Com esse entendimento, a desembargadora...

Declarar pobreza não é suficiente para Justiça gratuita, afirma desembargadora do TJ-SP

A mera declaração de hipossuficiência — quando a parte afirma no processo que não tem condições de arcar com...

Multa a herdeiro por infração ambiental que não cometeu é ilegal

A aplicação de multa administrativa por infração ambiental a um herdeiro de terreno transmitido como herança é ilegal se...

Ofensa homofóbica gritada em público é discriminação, e não injúria racial

Não há que se falar em injúria racial, mas, sim, em discriminação e preconceito contra homossexuais na ocasião em...