30 de julho é o Dia Mundial Contra o Tráfico de Pessoas: relação estreita com o trabalho escravo

30 de julho é o Dia Mundial Contra o Tráfico de Pessoas: relação estreita com o trabalho escravo

O Brasil se habituou a ver na TV durante a década de 1980 e 1990 uma escalada de pessoas desaparecidas. Ao passo em que este número crescia pela expansão da mídia massiva, o que fazia com que os casos de denúncia ficassem em maior evidência, o desaparecimento também é, em partes, motivado por um crime ainda pouco discutido: o tráfico de pessoas. No domingo (30), o Dia Mundial Contra o Tráfico de Pessoas é pautado para discutir algumas das implicações aterradoras que existem em torno do tópico.

O Tribunal Regional do Trabalho da Paraíba (13ª Região) apresenta esta discussão por conta de outro crime intrinsecamente ligado ao tráfico humano, que é a exploração de trabalho análogo ao escravo. A demanda pela escravidão contemporânea é enorme, por mais que cause espanto e horror ao pensarmos que este ainda seja um problema grave na terceira década do século XXI. No Brasil, a cada 24 horas, ao menos 8 pessoas são resgatadas das mãos do trabalho escravo contemporâneo, um número ainda baixo diante da subnotificação estimada da atividade.

De acordo com dados informados pela Organização das Nações Unidas (ONU), uma estimativa conservadora dá conta que o tráfico de pessoas para fins de trabalho escravo, incluindo os de servidão doméstica e exploração sexual, gera um lucro de US$ 32 bilhões (algo em torno de R$ 150 bilhões na cotação atual). A definição do tráfico de pessoas para ONU é que se trata de um crime que explora mulheres, crianças e homens para diversos fins, como exploração sexual, trabalho forçado, remoção de órgãos, adoção ilegal, entre outros. Contudo, a perspectiva mais recente em torno do tempo acaba se entrelaçando com o problema do trabalho escravo.

“Antigamente, o que se relacionava em um primeiro momento ao tráfico de pessoas na mente das pessoas era o tráfico de órgãos ou sexual. No entanto, pensando na legislação brasileira, a maior parte da população traficada no país é a de jovens homens negros levados com o propósito de servirem ao trabalho escravo”, ressaltou o o auditor-fiscal do trabalho e chefe da Divisão de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo (Detrae) do Ministério da Economia, Matheus Viana.

No Brasil, o tráfico de pessoas é um fenômeno complexo e multifacetado, que envolve diferentes perfis de vítimas e de traficantes, bem como diversas modalidades e rotas de exploração. De acordo com o Observatório da Erradicação do Trabalho Escravo e do Tráfico de Pessoas, mais de 60 mil pessoas foram encontradas em condições análogas ao trabalho escravo no Brasil entre 1995 e 2022.

Na Paraíba, neste mesmo período, foram resgatadas 75 pessoas em condição análoga à de escravo. No entanto, o perfil muda ao buscarmos a origem das pessoas resgatadas pelo país. “A Paraíba, assim como vários estados nordestinos, não são espaços em que se recebem tantos trabalhadores traficados para trabalho escravo, mas são estados ‘exportadores’ da mão de obra escrava, que saem daqui nessas condições para trabalharem em outras regiões, como Norte e Sul, especialmente. A migração interna no país é um elemento fortíssimo quando falamos de tráfico de pessoas”, destacou Matheus Viana.

E, de fato, as estatísticas demonstram isso. Ao olharmos as estatísticas de resgatados do trabalho escravo naturais da Paraíba de 2002 a 2022 no Observatório da Erradicação do Trabalho Escravo e do Tráfico de Pessoas, o número sobe para 584, oriundos de todas as regiões do estado, com maior prevalência das cidades sertanejas de Patos (66) e Pombal (55). A maioria dos resgatados são adultos jovens, entre 18 e 24 anos. Os trabalhos na agricultura e pecuária eram a maioria (62%) e cerca de 30% dos resgatados são analfabetos.

Os dados da Paraíba também corroboram com o que apontou o chefe do Detrae, pois, no que tange à raça, 56% dos resgatados da Paraíba são pardos ou pretos. Matheus Viana também enfatiza outros índices que revelam o perfil das pessoas traficadas no país. “A vulnerabilidade social é um fator. Se você joga no mapa, encontra municípios com baixo IDH, baixos índices de empregabilidade e de educação, que estão mais suscetíveis a ter exploração do trabalho e o tráfico de pessoas”, completou.

Pessoas trans e profissionais do sexo também estão mais vulneráveis a se tornarem alvo do tráfico de pessoas. “Nossa sociedade tem um olhar desumanizador para certas parcelas da sociedade e isso colabora com os traficantes. O tráfico de pessoas para fins de exploração sexual acaba atingindo muitas mulheres cis, mas são as mulheres trans que mais sofrem com o preconceito, com a falta de ação e com a ausência da efetividade das políticas públicas para ampará-las”, enfatizou o auditor-fiscal do trabalho.

O enfrentamento ao tráfico de pessoas no Brasil é fundamentado na Política Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (Decreto nº 5.948/2006), na Lei nº 13.344/2016 e nos Planos Nacionais de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, que seguem as diretrizes dos instrumentos internacionais que orientam os países nesta matéria, mas principalmente baseiam-se sob a ótica dos direitos humanos e das dimensões socioeconômicas, culturais e políticas que perpassam esse fenômeno.

Coração Azul

Durante todo o mês de julho, o Ministério Público do Trabalho (MPT) realizou uma Campanha Coração Azul a nível nacional, com o objetivo de prevenir e combater o Tráfico de Pessoas para fins de Trabalho Escravo. O Tribunal Regional do Trabalho da Paraíba (13ª Região) foi uma das parceiras do MPT no estado para o lançamento da campanha, em evento realizado na última quarta-feira (26), no Auditório do Fórum Maximiano Figueiredo, que promoveu o Ciclo de Debates “Tráfico de Pessoas e Trabalho Escravo: Conhecer para enfrentar”, mediado pela juíza do trabalho e gestora regional do Programa Trabalho Seguro (PTS), Rafaela Benevides.

A diretora da Escola Judicial do TRT da 13ª Região (Ejud13) e ouvidora regional da mulher, desembargadora Herminegilda Leite Machado, esteve presente tanto na abertura quanto no encerramento no evento, enfatizando a importância do momento. “Se estamos aqui discutindo estas questões que ainda assolam este país, é porque temos a democracia que permite que investiguemos e combatamos o tráfico de pessoas e o trabalho escravo. Precisamos defendê-la para continuarmos na ação contínua de combate a essas práticas”, enfatizou.

Para denunciar casos suspeitos ou confirmados de tráfico de pessoas no Brasil, é possível ligar para o Disque 100 ou para o Ligue 180 (Central de Atendimento à Mulher), que funcionam 24 horas por dia, todos os dias da semana. Também é possível procurar as delegacias especializadas em crimes contra os direitos humanos ou as unidades da Polícia Federal.

Com informações do TRT13

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